domingo, dezembro 09, 2012

A morte do arquiteto e FHC-Vitor Hugo Soares

-blog Noblat

A morte do arquiteto e FHC, por Vitor Hugo Soares

Não fosse a notícia da morte de Oscar Niemeyer na noite de quarta-feira (5/12), alçada às manchetes e a outros espaços de destaque dos mais importantes meios de comunicação impressos e eletrônicos do mundo - como a poeira de prata que se espalha incontida como no final do romance "Opinião Pública", de Eduardo Zamacois - e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso seguramente seria o personagem desta primeira semana de dezembro de 2012.

É factual, embora entristecedor, que aqui e ali - no Brasil, principal e desgraçadamente – algumas poucas vozes insanas e carregadas de mágoas, ciúmes e rancores ideológicos, tenham tentado reduzir com ofensas pessoais e sandices, a magnitude da vida e da obra do arquiteto carioca.

Ainda assim - doa em quem doer - ninguém chegou perto de conseguir nem mesmo arranhar o reconhecimento planetário da grandeza (profissional e humana) do comunista Oscar Niemeyer.

É preciso respeitar "Sua Excelência, o fato", como recomendava o velho timoneiro do MDB, Ulysses Guimarães. Outro grande na memória do país, que partiu há mais tempo.

Ou, como alguns acreditam piamente, "segue encantado" sob as águas do Oceano Atlântico, onde caiu em tarde de tempestade o avião que o conduzia de volta a Brasília, depois de um feriadão de descanso na região dos lagos do Rio de Janeiro.

FHC, o vivíssimo presidente honorário dos tucanos (e guru político e intelectual de tanta gente mais fora dos partidos espalhada por aí), fica em distante, mas honroso, segundo lugar entre os destaques desta semana para não esquecer.

Podem acreditar: diante de tudo que se viu e ouviu por aí nesses primeiros dias do último mês do ano, isso não é pouca coisa.

Verdade seja dita: foi marcante a passagem e a performance do ex-presidente FHC por Brasília, dois dias antes da morte de Niemeyer, o arquiteto que concebeu e moldou a cidade com seu traço singular e inigualável.

Queiram ou não os maledicentes que, em geral, jamais construíram nada, à exceção de potes e potes cheios de mágoa e inveja.

Mas voltemos a FHC, para não perder o rumo destas linhas. A começar (mal comparando com acontecimentos recentes, na campanha municipal em São Paulo, tendo o ex-presidente Lula e o ex-ministro Fernando Haddad, do PT, como protagonistas) pelo fato do líder tucano ter desembarcado no Planalto Central trazendo Aécio Neves debaixo das asas.

Foi lançar o senador e ex-governador de Minas Gerais como candidato do PSDB (e, quem sabe, das oposições, o sonho mais acalentado) à sucessão da presidente Dilma Rousseff, nas eleições de 2014.

"No encontro com os autarcas tucanos", como registrou o importante jornal português Diário de Notícias, Fernando Henrique tentou mexer com a apatia preocupante no seio do principal partido de oposição no Brasil, aumentada com a derrota de um dos marechais das tropas tucanas, José Serra, na disputa pela prefeitura da mais importante cidade País.

FHC fez um dos discursos mais contundentes da sua larga trajetória de tribuno parlamentar e de respeitável palanqueiro. Em alguns momentos da fala para os prefeitos, lembrou o vigoroso combatente contra a ditadura que este jornalista viu em manifestação memorável no Largo do Terreiro de Jesus, em Salvador, ao lado de Ulysses, Tancredo Neves, Chico Pinto, entre outros, no tempo do "navegar é preciso".

Em outros, FHC buscou ser o estadista de uma época de transição, ou o mestre da academia dando aulas de conduta ética , moral e cívica aos seus "alunos".

Estabelecendo confrontos e traçando diferenças entre tucanos e petistas, definindo novas estratégias para futuros combates, lançando o anzol, principalmente em águas pernambucanas e cearenses, para pescar novas alianças e novos aliados.

Houve momentos em que, claramente, FHC chamou os adversários para brigar no meio da rua. Como os garotos que conheci no tempo de escola primária nas cidades à beira do Rio São Francisco onde morei na infância. Na rua, o garoto que queria briga traçava uma linha na areia com o pé. Cuspia em cima e dizia: "É a sua mãe". O inimigo reagia na certa. E o pau cantava para valer.

Para FHC, PSDB é muito diferente do PT nas questões morais e éticas. Disse ele aos prefeitos reunidos em Brasília, que os petistas que estão sendo condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – incluindo o ex-ministro José Dirceu - alegam de forma errada que estavam cumprindo uma missão.

"Estão sendo condenados por crimes que cometeram. Ninguém está sendo condenado pelo passado. Na cabeça deles, podem estar cumprindo uma missão. Na nossa, não. Nós somos diferentes do PT", frisou o ex-presidente da República, sob aplausos dos tucanos cheios de si.

Mas o conceito não bastava, e FHC partiu para o confronto direto com os governos petistas de Lula e Dilma: "As agências estão carcomidas. Foram divididas entre os partidos. E a transposição do Rio São Francisco? Um descalabro. E os estaleiros? E as plataformas? Esse voluntarismo está ligado a uma política errada, de que o Estado faz o que quer. Aumentaram os impostos. Agora, 36% do PIB. E estão transformando os recursos em gastos correntes. O nosso PIB é um PIB pigmeu. O que falta é competência", discursou o ex-presidente.

FHC, segunda-feira, 3, fez no Planalto Central como os garotos do sertão antigamente, quando queriam medir forças. Dois dias depois, quando os petistas se armavam para reagir, sobreveio um motivo superior capaz de estabelecer trégua momentânea nos dois lados: a morte do grande arquiteto, Oscar Niemeyer.

Quando terminar o luto oficial de sete dias decretado pela presidente Dilma (ou antes), é quase certo que virá o troco dos petistas. A conferir.

 

Vitor Hugo Soares é jornalista - E-mail: vitor_soares1@terra.com.br