O GLOBO - 01/11
Pelo jeito, vamos ter, encerrado o julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal, uma disputa entre poderes para o cumprimento de penas pelos réus que têm mandato parlamentar. Crise que pode ser agravada pelo PT se insistir na tese, legal, mas aética, de que o ex-presidente do partido José Genoino deve assumir um mandato no lugar do deputado Carlinhos Almeida, eleito prefeito de São José dos Campos.
Genoino, que foi condenado por corrupção ativa e formação de quadrilha, tem direito a assumir uma cadeira na Câmara dos Deputados por ser o primeiro suplente do PT paulista. Pela Constituição, ele pode assumir, pois a sentença ainda não tramitou em julgado, o que só ocorrerá depois da publicação do acórdão com a decisão final e a análise dos diversos embargos que sua defesa deve impetrar junto ao STF.
Toda essa tramitação terá início no mínimo seis meses depois do término do julgamento e da definição das penas, tempo previsto para a publicação do acórdão, o que deve ser atrasado também pelo recesso de fim de ano do Judiciário, que começa a 20 de dezembro e vai até início de fevereiro.
Esses prazos tornam previsível que os réus condenados só começarão a cumprir as penas a partir de agosto do ano que vem. Até lá, o deputado federal João Paulo Cunha poderá continuar no seu papel de deputado federal, e Genoino poderá assumir o mandato.
Há diversos exemplos de deputados que, embora já condenados, continuam trabalhando normalmente no Congresso. No caso do deputado federal Asdrúbal Bentes, do PMDB do Pará, acusado de trocar laqueaduras por votos em Marabá, o acórdão demorou quase dez meses para sair no Diário da Justiça. Falta ainda o STF analisar o embargo infringente da defesa.
Outro deputado, Natan Donadon, do PMDB de Roraima, condenado por peculato e formação de quadrilha, está há um ano e meio aguardando a decisão do STF sobre um embargo de declaração de sua defesa, embora esteja condenado a 13 anos de prisão, o que implica regime fechado.
E há ainda o caso recente do vereador Tiago Kriesel, do PTB, que, mesmo preso, foi reeleito em Bom Progresso, no noroeste do Rio Grande do Sul.
Quando o ex-ministro Cezar Peluso deixou seu voto por escrito antes de se aposentar, incluindo nele a pena de perda do mandato parlamentar de João Paulo Cunha, começou um debate sobre a independência dos poderes da República.
Os ministros do Supremo Tribunal Federal consideram que, se a posição de Peluso prevalecer, a Câmara dos Deputados terá que cumprir a decisão. O ministro Marco Aurélio Mello chegou a declarar que “é impensável” o Legislativo não cumprir uma determinação do órgão máximo do Poder Judiciário.
Já Marco Maia (PT-RS) usa a Constituição Federal para garantir que a decisão final é da Câmara dos Deputados. da qual é presidente. De fato, o artigo 55 determina que, entre outros casos, perderá o mandato o deputado ou senador “que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado” ou que “perder ou tiver suspensos os direitos políticos”.
No primeiro caso, a perda de mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal “por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”.
Já no caso de perda ou suspensão dos direitos políticos, “a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”. Dependendo da decisão final do STF, a Câmara terá o direito de apoiá-la ou não por votação secreta, ou terá apenas que declarar a perda do mandato.
Se o ex-presidente do PT José Genoino, mesmo condenado, decidir assumir seu mandato de deputado federal até que a sentença transite em julgado, estará apenas colocando um complicador a mais na questão, em uma tentativa de tumultuar o julgamento, dificultando suas consequências.