segunda-feira, maio 21, 2012

Agenda econômica em fase de mudança. Editorial O Globo


O GLOBO - 20/05

Dilma Rousseff assumiu para fazer um governo de "continuidade". Não poderia ser diferente. Eleita pela força do carisma de Lula, a presidente não teria motivos, até pela boa avaliação popular da gestão anterior, de que ela foi ministra, para mudar rumos. Mas os fatos precisam ajudar os planos. Quando não ajudam, é preciso agir.
No plano político, Dilma passou o primeiro ano em faxina. Quisesse ou não, afastou ministros atingidos por denúncias irrespondíveis.
Seis deixaram o ministério e, na substituição, a presidente usou método próprio: com a equipe montada segundo as regras do toma lá dá cá do fisiologismo, os partidos continuaram com as respectivas pastas, mas não só a presidente fez questão de escolher o novo ministro, como esteve, e está, atenta ao segundo escalão de cada ministério. Teve substanciais ganhos de popularidade, com índices superiores aos de Lula em início de primeiro mandato.
Na agenda econômica, a vida real também conspira para o governo Dilma fazer um ajuste de rota. Que, de alguma forma, já começou. Na gestão Lula, o governo pôde surfar a onda histórica do crescimento mundial sincronizado, no vácuo do salto da China num modelo de "socialismo de mercado", executado sob as armas de uma férrea ditadura política.
Num primeiro momento, as exportações rebocaram o país, que, depois, tracionou pela força do mercado interno, anabolizado pela política de aumentos reais do salário mínimo, benesses assistencialistas, estímulo ao crédito.
Na Era Dilma, a economia mundial mudou de sinal, com o agravamento da crise iniciada nos EUA, e o modelo de crescimento impulsionado pelo consumo interno se mostra de fôlego rarefeito.
O BC tem feito cortes substanciais na taxa básica de juros e o governo pressiona para reduções nas taxas de mercado. O endividamento do consumidor, porém, parece ter atingido um limite. Em abril, segundo o Serasa, a inadimplência subiu 4,8% em relação a março, o maior salto deste 2002. Os bancos, por sua vez, veem ampliarem-se os atrasos nos financiamentos à compra de veículos, enquanto lotam os pátios nas fábricas. Tudo leva a previsões de que a economia, no máximo, crescerá 3% este ano. Bateu no teto.
Há baixa produtividade na indústria, fechamento de mercados num mundo em crise, entre outros problemas que a desvalorização do real não resolverá — além de produzir inflação. Sintomático que Dilma comece a falar em nós estruturais, como os elevados impostos. Depois de começar a reduzir o peso de encargos trabalhistas em alguns setores, a presidente mira no custo de energia, fator negativo na competitividade brasileira no mercado externo. Com astronômicas alíquotas de ICMS que estados impõem sobre as contas de energias, sem contar os gravames federais, não há mesmo câmbio que compense custos: 43% em Minas, 47% no Rio de Janeiro e 33% em São Paulo. Isso torna a carga tributária sobre a energia uma das mais elevadas do mundo: 53% acima da média de todos os países.
Usem ou não o termo, o "custo Brasil", enfim, parece entrar na agenda oficial. Para desatar os nós, o Planalto terá de encarar reformas inexoráveis, cedo ou tarde: tributária, legislação trabalhista onerosa, previdência (INSS), desburocratização.
Ao mesmo tempo que desonera os custos de produção, será preciso conter o crescimento real constante dos gastos em custeio, para dar espaço à expansão dos investimentos públicos e da própria poupança interna.
Este é um projeto estratégico de governo.