quarta-feira, abril 18, 2012

Cena da economia - MIRIAM LEITÃO


O GLOBO - 18/04/12



Há dois motivos para o Copom derrubar os juros hoje para 9%: a inflação despencou e a atividade está fraca. O economista José Roberto Mendonça de Barros conta que há pressões de médio prazo que continuarão mantendo baixo o ritmo da economia. O investimento caiu, mudou o mercado de automóveis e os estoques estão altos. O governo só tem usado remédio de curto prazo. O país continua sem projeto.

O economista acha que por algum tempo a atividade ficará mesmo mais fraca. Neste momento, os números são puxados para baixo pelo setor automotivo e pela queda do investimento:

- No bimestre, a queda de veículos foi de 28%, por causa das férias coletivas, estoques elevados e redução relativa da demanda. A redução dos investimentos se reflete no setor de máquinas, tanto mecânicas quanto de comunicação. O setor de máquinas caiu 13%, de equipamentos elétricos e de comunicação, 10%. Isso sem falar no setor têxtil, que caiu 8%, e vestuário, 20%. Mas o mercado de trabalho está bom, o que mantém a renda do trabalhador.

O governo acha que os problemas são causados pelo câmbio, mas não é nisso que José Roberto acredita. No caso de caminhões, por exemplo, há um fator específico. As montadoras estão oferecendo caminhões com motor menos poluente, o Euro 5. Isso com atraso de cinco anos. O problema é que os compradores têm medo de não encontrar gasolina porque a Petrobras não conseguiu distribuir o novo combustível para este motor por todo o país. Há estoque grande de caminhões com motor velho. Quem vai comprar fica na dúvida.

- Há poucas vendas, estoques para 40 dias e muita indecisão nessa transição. A redução de juros pelo BNDES, no novo PSI (Plano de Sustentação de Investimento), deve aumentar um pouco as vendas - diz José Roberto.

No setor de automóvel, há outra conjuntura complicada:

- Durante muito tempo, a diferença entre o preço do carro novo e o usado não era muito alta, e o comprador comprava também para investimento. Em 2008, 35% dos veículos foram adquiridos por quem nunca teve carro. O primeiro automóvel já era zero. Agora, está havendo uma depreciação mais rápida do carro velho, a diferença cresceu, e a dívida às vezes é mais alta do que o valor do bem. Houve aumento da inadimplência, o que levou a uma queda meio brusca de demanda, em parte porque a classe C já está endividada.

A vantagem é que o mercado de trabalho continua bom, o que sustenta a capacidade de compra das famílias. José Roberto acha também que o Minha Casa, Minha vida compete com o carro. A família se endivida para comprar o imóvel, e mobiliá-lo, e adia a compra do automóvel.

- Como a indústria automobilística representa 25% da indústria de transformação, os dados continuarão fracos. Aqui, na MB Associados, já revisamos de 3,5% para 3% a previsão do PIB este ano - diz José Roberto.

Esta semana o próprio Banco Central divulgou que seu índice de atividade - o IBC-BR - mostrou queda em fevereiro pelo segundo mês seguido. Como a inflação caiu forte nos últimos meses, há espaço então para o corte de 0,75 ponto percentual que é aguardado na reunião de hoje. O problema é que tanto o órgão quanto o mercado estão prevendo inflação em alta no ano que vem. O que o país busca e precisa é de inflação baixa por longo tempo. A gangorra da inflação e dos juros não faz bem para a economia. Temos que entrar num estágio de inflação bem baixa e juros também baixos por longo período. É o melhor ambiente para as empresas e as famílias fazerem seu planejamento.

Outro fator que tem afetado a economia é a baixa produtividade. Estudo recente do economista Regis Bonelli mostrou que na última década a produtividade da economia brasileira subiu em média apenas 0,6% ao ano. A da indústria foi negativa, caiu 0,8%. A dos serviços ficou baixa, 0,5%. A produtividade da agricultura é que subiu forte: 4%.

A China também está com uma atividade mais fraca, o que nos afeta, apesar de ser um ritmo menor ao estilo chinês, sempre alto para os padrões mundiais. José Roberto Mendonça de Barros avalia que a China não terá queda brusca, apenas redução, e que, ao mesmo tempo, ela está fazendo uma reestruturação do seu crescimento:

- Está liberando mais o mercado para investimento estrangeiro, mudando lentamente o câmbio e redirecionando o crescimento para o mercado interno. Isso elevará salários e tornará mais difícil para ela ser exportadora de bugigangas. Terá que elevar o nível dos produtos que fornece. Na área de energia, ela está investindo fortemente nas fontes renováveis não convencionais, sobretudo vento.

Nessa comparação é que o economista diz que fica aflito com o cenário brasileiro, porque aqui se pensa no PIB do trimestre seguinte e não o longo prazo. Ele diz que a "passividade" brasileira diante dos gargalos conhecidos que impedem o crescimento sustentado é um risco.

A inflação está baixa e isso nos ajuda, mas no segundo semestre José Roberto acredita que ela subirá um pouco. Aliás, não apenas ele. Um dos fatores será a entressafra de alimentos que este ano será mais forte, com elevação mais acentuada de preços, e outro é a necessidade de correção na gasolina. O preço que a Petrobras fornece às distribuidoras continua parado, o que fez, segundo conta de Adriano Pires, do CBIE, a empresa perder R$ 9,6 bilhões nos últimos 12 meses até fevereiro. Pior, isso está estrangulando a indústria do etanol. Mais uma prova da visão de curto prazo da política econômica.