domingo, março 18, 2012

Fazer a coisa certa - SUELY CALDAS

O ESTADÃO - 18/03/12

O Ministério da Fazenda tenta apagar focos do incêndio, mas nada faz
para dominar o fogo. É assim que o governo Dilma tem agido para
reverter a persistente e continuada queda da produção industrial. A
agenda do governo é de curtíssimo prazo, as decisões são confusas e
por vezes provocam efeitos contrários ao objetivo e faltam
planejamento e ações voltadas a superar deficiências antigas,
conhecidas, estruturais, que geram perda de competitividade do
produto.

O único objetivo perseguido é apressar a retomada do crescimento, mas
o jeito atabalhoado dificulta chegar lá.

É claro que o governo precisa combater dificuldades conjunturais com
medidas de curto prazo, mas, sem estratégia para suprimir os gargalos
que encarecem a produção e represam o crescimento, a economia não
avança. Apagam- se incêndios aqui e ali, mas o fogo vai continuar
reaparecendo. Planejamento, estratégia,projeto, rumo é o que falta ao
governo Dilma Rousseff. E logo ela, que tanto reclamou do governo FHC
quando ministra de Minas e energia: " Encontrei o setor
elétricocompletamente desorganizado, um caos, sem planejamento, sem
rumo, sem futuro", queixava-se em 2003. Pois agora é a sua vez,
presidente Dilma.

As reformas estruturais são a parte mais visível dessa omissão. Lula
começou a tocá-las e desistiu diante de pressões políticas. Dilma é
diferente, tem mostrado postura firme nos atritos com os partidos
aliados. Delas e esperava atitude mais afirmativa em relação às
reformas. Mas não aconteceu. No início do governo, foi logo avisando:
nada de reformas. A previdenciária vai-se limitar à criação do fundo
de pensão para os novos servidores, adiando para 2030 o recuo do
gigantesco déficit da previdência pública, que este ano vai somar R$
60 bilhões e continuará crescendo. A trabalhista ela garantiu, em
encontro com sindicalistas na quarta-feira: "Não terá em meu governo".
A tributária se resume a trocar a contribuição ao INSS por um imposto
sobre faturamento de alguns setores industriais. E só. A política,
essa é que não sai mesmo.

As reformas ajudariam muito a reduzir o custo Brasil, dar eficiência
operacional à economia e vida longa ao crescimento sustentado. Mas não
só. Os investimentos em infraestrutura precisam desemperrar para
suprimir os gargalos que encarecem e freiam o escoamento da produção.

O PAC não cumpre este papel e os investimentos do governo não chegam a
2% do Orçamento. Seria preciso criar condições para estimular o setor
privado a investir em infraestrutura, aperfeiçoando regras de
regulação e garantindo autonomia às agências reguladoras; estruturando
mecanismos de crédito para os bancos privados concederem empréstimos a
prazos longos e juros compatíveis com o investimento.

São medidas que surtem efeito no curto, médio e longo prazos, mas
indispensáveis para a economia avançar, gerar empregos e, quem sabe,
passar a crescer a taxas chinesas.

Hoje, crédito barato para investimento é privilégio de poucos. Ou a
empresa tem poder financeiro para conseguir captar dinheiro no
exterior ou corre para o BNDES, que concentra boa parte de seu
orçamento em poucos e grandes grupos, deixando empresas menores sem
alternativa. Além de caros,empréstimos de bancos privados são de curto
prazo, mais dirigidos a capital de giro e raramente para investimento.
Eis um importante desafio para a experiente diretoria do Banco
Central: criar instrumentos para os bancos privados reduzirem juros e
ampliarem prazos em seus empréstimos. Aportar mais e mais dinheiro
para o BNDES está mais para distorção do que solução e não ajuda a
ampliar e democratizar o crédito de longo prazo para o investimento
produtivo.

"Ridícula", como classificou há dias o vice-presidente do BNDES, João
Carlos Ferraz, a taxa de investimento fechou 2011 em 19,3% do PIB,
abaixo de 2010.

Na China ela é de 40%. Elevá-la para 25%,como pretende o governo,
implica criar meios para aumentar também a taxa de poupança, o que não
ocorre da noite para o dia, mas é preciso começar já. Apagar incêndio
é paliativo transitório. O que precisa é fazer a coisa certa.