quinta-feira, janeiro 19, 2012

No meu tempo Zuenir Ventura


O Globo
Publicado em 18/01/2012



Otempora! O mores!" já dizia o velho Cícero em latim, e repetíamos em português no colégio: "Que tempos! Que costumes!" Mas não só os costumes e a moral mudaram com o tempo, o clima e a linguagem também. Na minha época, por exemplo, havia quatro estações por ano, não por dia. O capitão era o último a abandonar o navio, não o primeiro, como o do Costa Concordia. As chuvas de verão eram esperadas, não uma surpresa para as autoridades. Doações que não chegavam às vítimas não eram "desvios de verba", mas roubo de dinheiro, literalmente. Político que garantia só deixar o cargo morto morria de fato, se suicidava, não saía na maior cara de pau para presidir um outrora respeitável partido.
Suposto bandido não carregava adjetivo, só arma, era bandido, e ponto final. Mais de R$200 milhões na conta de um magistrado ou funcionário de um tribunal do Rio de Janeiro era considerado um escândalo, não "movimentação financeira atípica". Na terra do Ancelmo, já se faziam saliências embaixo de edredom, como as que acabam de ocorrer entre um modelo e uma estudante no Big Brother 12, causando tanta polêmica e a eliminação do rapaz. Só que no nosso tempo não seria preciso recorrer à polícia para descobrir se eram "carícias consensuais" ou abuso sexual.
A Europa, até outro dia, servia de modelo e exemplo para o mundo todo; hoje é uma velha dama decadente, a cada dia mais humilhada e rebaixada, carente de socorro até dos países emergentes. Em passado não muito distante, o seio feminino era tido como um espaço perfeito, irretocável, ao mesmo tempo zona erógena e fonte primeira de alimentação do ser humano. A moda de "consertá-lo" por imposições cosméticas transformou-o de produtor de leite materno em depósito de silicone capaz de sujeitá-lo aos riscos de nódulos, inflamações e infecções, como está ocorrendo de maneira absurda no Brasil.

Joelhada e pontapé acima do pescoço davam desclassificação em qualquer esporte. Agora dão consagração. Vejam esse trecho da cobertura da última exibição dos chamados gladiadores do terceiro milênio: "O golpe (aquele chute "cinematográfico" de Edson Barboza no rosto do inglês Terry Etim) levou a torcida à loucura e foi elogiado como um dos mais belos da história do UFC." No meu tempo, "belo" pontapé era o que se dava na bola, não na cara do adversário. Afinal, uma coisa parece não ter mudado: hoje, prende-se bicheiro do mesmo jeito que antigamente — para soltar logo depois, como deve acontecer com Anísio Abraão, da Beija-Flor, daqui a pouco, até o carnaval.

Desmentidos. Não é verdade que esse Paulo Ventura, da série "O brado retumbante", seja meu parente, mesmo que distante. E mais: nós, eu e sua mulher, o "feixe de luz" do Jorge Moreno, somos apenas bons amigos.