FOLHA DE SP - 16/10/11
SÃO PAULO - O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, está prestes a cometer um pequeno crime contra as crianças da cidade. Ele deve sancionar ainda neste mês o projeto de lei recém-aprovado pela Câmara que prevê a contratação de até 600 professores para darem aulas de religião em escolas municipais.
É claro que pais são livres para educar seus filhos na fé de sua preferência, mas isso deveria ser feito no contexto de seus lares e templos. Assim como igrejas não têm o hábito de ensinar física e aritmética em seus cultos, a escola pública não deveria ensinar religião.
O primeiro argumento é de ordem econômica. Não faz sentido a prefeitura investir recursos numa procissão de 600 professores de religião quando ainda há tantas lacunas no ensino de matérias tão fundamentais como português e matemática.
No que diz respeito ao quadro institucional, a encrenca é ainda maior. Na trilha do governo estadual, o projeto cria um modelo de ensino religioso-confessional, que é difícil de conciliar com o princípio da laicidade do poder público. Pela proposta, de autoria da própria prefeitura, os docentes, formados em sociologia, filosofia, história ou teologia, precisarão seguir as orientações da "autoridade religiosa" que representem.
Isso significa que o professorado estará dividido em feudos eclesiásticos, nos quais cultos majoritários acabarão engolindo os minoritários, e que as tais autoridades religiosas terão poder de definir o que será ensinado aos alunos da rede pública, numa clara violação da separação entre Estado e igreja.
O pecado original, vale lembrar, não é de Paes, e sim da Constituição de 88, que estabeleceu o ensino religioso no ciclo fundamental. Mas a Carta em nenhum momento determina que se rifem cargos públicos -e com eles o futuro das crianças- como parte de um acerto que atende aos interesses eleitorais do prefeito e aos apetites de algumas igrejas.