FOLHA DE SÃO PAULO - 01/07/11Governo controla gastos, mas corta investimento; falta de planos limita ação privada na infraestrutura
VAI DAR mais ou menos certo o plano do governo de conter o aumento de gastos neste ano. Vai dar ainda mais certo se o governo fizer o corte errado, porém agora inevitável, nas despesas de investimento.
Como de praxe, e ao contrário do prometido, parte importante da economia dependeu da redução da despesa em investimento, em termos absolutos e relativos (ao tamanho da economia, do PIB).
Como prometido, a contenção de despesa não caiu na conta dos "gastos sociais", em particular das transferências diretas de renda. Como era esperado, mas nem tanto, o superavit primário (receitas menos despesas, exceto os gastos com juros) depende mais do aumento da receita do que do corte de gastos.
Nas contas de Mauricio Oreng, economista do Itaú, o aumento do superavit primário neste ano, equivalente a 1,2% do PIB, deveu-se em 57% ao aumento da receita e, claro, 43% ao aumento suave dos gastos (dados de janeiro a maio deste ano, conta feita sobre os dados divulgados ontem pelo governo).
O corte em investimentos é mais ou menos inevitável, como é costume histórico no país, porque há grandes despesas obrigatórias e o Orçamento é engessado. Gasta-se o grosso em servidores (quase 23% do total) e em previdência (33,5%). Os gastos sobre os quais o governo tem mais liberdade de ação, "discricionários", são apenas 22% do total. Estão incluídos aí os investimentos (pouco mais de 5% do total).
Isto posto, coisa toda muito sabida, pergunta-se qual o plano do governo para retomar investimentos e, ao mesmo tempo, continuar a reduzir a dívida pública (é para isso que serve o superavit primário). Há problemas adiante.
No ano que vem, haverá alguns aumentos de gastos grandes e inevitáveis, como o do salário mínimo, reajuste que bate na conta da Previdência Social. A despesa com juros da dívida pública será maior, pois a inflação será desagradável até o final de 2012, pelo menos.
O crescimento do PIB não deve passar de 4%, como neste ano -a arrecadação de impostos deve, pois, crescer menos. Neste ano, ainda cresce a 9,3% (incluída da receita da Previdência Social e excluídas as transferências federais para Estados e municípios).
Incentivar investimentos privados, embora orientados pelo governo, poderia ser uma solução.
Meio a contragosto e no "desespero da Copa", o governo vai privatizar aeroportos. No segundo semestre, pode anunciar os portos que deseja ver construídos por empresas privadas, programa que vem sendo regulado e desenvolvido lentamente desde 2008 e que, dadas algumas incertezas da regulação, pode não atrair investimento bastante.
Com alguma sorte, o dinheiro começa a pingar em aeroportos em 2012. Nos portos, talvez em 2013. Não há planos visíveis de conceder estradas (inclusive as que levam mercadorias aos portos).
Concorrências problemáticas emperram o início de hidrelétricas como Belo Monte. O governo perde tempo, energia e, provavelmente, dinheiro, insistindo em ideias de jerico como a do trem-bala. A esperança é que o projeto, de tão ruim, acabe por não sair do papel e não desvie capital para uma obra economicamente inviável, o que já vai acontecer com os dinheiros gastos com estúpidos estádios de futebol bilionários.