O Estado de S. Paulo - 29/04/2011 |
A presidente Dilma Rousseff declarou que "o governo está, diuturnamente, e até noturnamente, atento a todas as pressões inflacionárias, venham de onde vierem". Mas reiterou o diagnóstico de que a aceleração da inflação decorre da elevação de preços de commodities, pouco tendo que ver com a expansão desmesurada da demanda interna. E insistiu que o governo prefere aguardar os efeitos das medidas de combate a inflação já tomadas, sem sacrificar prematuramente o desenvolvimento econômico e social. O ministro da Fazenda bateu nas mesmas teclas. Afirmou que "o Brasil não está mal na foto da inflação mundial" e que é preciso "moderar o crescimento da demanda sem matar a galinha dos ovos de ouro".
A galinha de ovos de ouro vem tendo, de fato, um desempenho espetacular. E é perfeitamente compreensível que o governo esteja alarmado com a possibilidade de que isso venha a ser afetado. No 1º trimestre de 2011 a arrecadação administrada pela Receita Federal mostrou uma taxa de crescimento nominal, em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, de nada menos que 19,55%. Deflacionado pelo IPCA, isso equivale a uma expansão real de 12.7%, o que corresponde a pelo menos o triplo da taxa de crescimento do PIB previsto para este ano.
Tal fartura fiscal não chega a ser surpreendente. Além da combinação do forte aquecimento da economia com o aumento de eficácia da máquina arrecadadora, na esteira da ampla disseminação da nota fiscal eletrônica. É com essa fartura que o governo conta para cumprir a meta fiscal de 2011 e ainda manter expansão substancial do dispêndio tradicional, em paralelo à que já vem sendo feita por meio das transferências do Tesouro ao BNDES, não contabilizadas no resultado primário. Tendo em conta esses dois canais de expansão fiscal, é fácil entender por que o ministro da Fazenda apresentou ao CDES uma previsão de crescimento real do investimento agregado de 10,4% em 2011. O problema é que, como era de esperar, tal sobrecarga tributária, combinada com a apreciação cambial, vem acirrando as dificuldades por que vem passando empresas de vários setores. Para fazer face a insatisfação que se acumula, o governo passou a acenar com a perspectiva de uma reforma tributária ""realista", com agenda fatiada. Uma das fatias envolveria medidas de desoneração da folha de pagamento. Mas, apesar do excelente desempenho da arrecadação, o governo já deixou claro que não está disposto a abrir mão de receita tributária. Ou seja, algo mais terá de ser onerado para que a folha seja desonerada.
Na discussão sobre como exatamente fazer tal redistribuição de carga tributária, têm surgido propostas impensadas de todo tipo. A Confederação Nacional dos Serviços, com base em estudo supostamente preparado pela Fundação Getúlio Vargas, defende a criação de uma nova CPMF. Já a Fiesp - é o que se noticia - prefere que a conta seja repassada a Cofins. E, no governo, aventa-se a possibilidade da criação de um novo imposto sobre faturamento, cobrado em cascata.
O mínimo que se pode dizer é que o foco da discussão está mal colocado. O que se faz necessário é uma diminuição dos encargos sobre a folha de pagamento que implique efetiva redução da carga tributária agregada, seja porque o governo se dispôs a abrir mão de parte do aumento de receita que vem auferindo, seja porque, afinal, decidiu conter a expansão de gastos na Previdência. Não faz sentido desfigurar mais ainda o sistema tributário para tentar desonerar a folha de pagamento. |