sexta-feira, março 11, 2011

VINICIUS TORRES FREIRE - Sob nova administração, de fato

Folha de S Paulo
Na ata do Copom, Banco Central explicita de modo oficial que inflação não se combate apenas com juros


MERECE REGISTRO para a história econômica "contemporânea" do país, pós-Real, o dia em que foi declarado oficialmente que a política monetária estava sob nova administração. Política monetária: as decisões do BC sobre juros e dinheiro.
O BC declarou que mudou o modo de fazer política monetária no Brasil, que era mais ou menos o mesmo na teoria e na prática desde 1999, quando foi criado o regime de metas de inflação. A mudança foi registrada em ata e publicada ontem.
Trata-se da "Ata do Copom", do Comitê de Política Monetária do Banco Central, que decide em quanto deve ficar a taxa de juros "básica" do país, a Selic. O documento é divulgado na semana seguinte ao da decisão sobre os juros.
Também conhecida como "chata do Copom" por jornalistas da área, a ata nem mesmo o é. É uma exposição de motivos da decisão sobre juros e uma orientação à praça sobre o que o BC deve fazer a respeito da inflação no curto prazo -um documento tedioso, cheio de dedos e recados, mas que não registra o que se discutiu na reunião sobre os juros.
Mas a "chata do Copom" surpreendeu, ontem. A uma certa altura, fica claro que, além da taxa de juros de curto prazo (a Selic), existem instrumentos alternativos e que podem ser empregados de modo recorrente no controle da inflação. Esse conjunto de instrumentos é o que vem sendo chamado de "medidas macroprudenciais" desde o final do ano passado, aqui no Brasil.
É fato que o BC e, muito mais, o resto da equipe econômica diziam desde o final do ano passado que as "macroprudenciais" poderiam evitar alta maior do juro. Mas, até aqui, a coisa tinha mais um jeitão de recurso extraordinário do que de método. Isto é, medidas macroprudenciais não eram dadas como substitutos regulares de altas de juros.
As "medidas macroprudenciais" são decisões administrativas do BC que afetam a quantidade de dinheiro disponível para crédito nos bancos e, assim, a taxa de juros para o tomador final. Por meio delas, obriga-se a banca a deixar mais dinheiro parado no BC a deixar de reserva mais dinheiro para cada empréstimo concedido, a elevar tais exigências se o financiamento é de longo prazo (o que acaba por encurtar os prazos dos crediários) etc.
A princípio, tais medidas têm como objetivo evitar que o sistema financeiro se exceda, empreste demais a quem não tem como pagar.
Calotes em massa avariam bancos, e bancos avariados são um problema para a economia inteira. Mas tais medidas têm como efeito colateral óbvio a redução da oferta de crédito, do consumo e da inflação.
Os economistas mais ou menos ortodoxos dizem que medidas "macroprudenciais" colaboram no controle da inflação, mas têm defeitos: 1) afetam pouco as decisões de poupança e de investimento; 2) sua intensidade e o tempo de seu efeito são incertos ou ainda desconhecidos; 3) criam distorções e ineficiências no mercado de crédito.
Na ata divulgada ontem afirma-se que nova rodada de "macroprudenciais" pode fazer com que o BC não eleve os juros em mais 0,75 ponto percentual no ano, alta já tida como pequena para parte dos observadores da economia. Além de reforçar a importância de medidas ditas heterodoxas no controle da inflação, o BC, de resto, mostrou-se otimista sobre a queda dos preços.

vinit@uol.com.br