domingo, março 13, 2011

SUELY CALDAS A proposta Palocci para desonerar a folha

O ESTADO DE SÃO PAULO - 13/03/11
Compromisso firme de campanha da presidente Dilma Rousseff, a desoneração da folha de salários é anunciada há três anos "para muito breve" pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. No mês passado, o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, garantiu que não passa deste primeiro semestre. Mais sincero e menos político, o secretário da Receita Federal (RF), Carlos Alberto Barreto, afirmou no Congresso que "não há modelo simples nessa matéria. É complexo e tudo passa por decisões políticas". O ministro Antonio Palocci tem na gaveta um modelo que pretendia adotar quando era ministro da Fazenda, no primeiro mandato de Lula. Está na hora de desengavetar.

Aliviar a carga tributária sobre salários é intenção de todo governante que passa pelo Planalto. Além de causar perda na competição com outros países em investimentos e produtos exportados, os tributos sobre salários no País expulsaram metade dos trabalhadores para a informalidade. São os sem direitos trabalhistas, sem futuro e sem esperança de Previdência na velhice.

Tem razão o secretário da RF. A decisão não é fácil, atiça o vespeiro dos sindicatos, que o governo quer ver quietinho; pode prejudicar mais de 30 milhões de trabalhadores com carteira assinada se seus direitos forem atingidos; e os sindicatos patronais acionarão seu poderoso lobby se perderem a receita do Sistema S. Em compensação, outros 30 milhões de trabalhadores passarão a ter direitos trabalhistas reconhecidos na lei, mas trata-se de uma maioria silenciosa, desprezada pelos sindicatos. Por isso, Dilma precisará de muita resistência e coragem política para contrariar interesses. FHC e Lula desistiram.

O governo não revela qual solução prepara para o problema. Já se falou em desoneração seletiva da contribuição ao INSS, para favorecer setores exportadores prejudicados pelo cambio valorizado; em reprisar a CPMF, que agora financiaria a Previdência; em incidir a contribuição sobre o faturamento das empresas e não sobre a folha de salários.

De toda a carga fiscal, que onera em 36,8% a folha de salários, o foco recai sobre a contribuição ao INSS não só porque é a maior parcela (20% do total), mas também porque politicamente não convém ao governo agora antecipar tensões, se falar em tirar 3% para acidentes de trabalho, 2,5% de salário educação, 2,5% do Sistema S, 0,6% do Sebrae, 02% do Incra e 8% do FGTS.

Mas é possível, sim, reduzir ou até eliminar a maioria dessas taxas. Salário-educação quase nunca chega ao trabalhador; é preferível as empresas reservarem verbas para acidentes de trabalho do que serem obrigadas a recolher ao governo; se os empresários aplicarem a receita (hoje de R$ 9 bilhões) do Sistema S apenas em treinamento da mão de obra, essa taxa de 2,5% pode ser fortemente reduzida. E qual o sentido de carimbar tributos para o Sebrae e o Incra?

O grande nó do custo trabalhista é o financiamento da Previdência. Calcula-se que a redução de cada ponto porcentual dos 20% da contribuição ao INSS represente perda de R$ 3,8 bilhões aos cofres da Previdência. Portanto, se a taxa cair para 16%, o déficit do INSS saltaria de R$ 44,3 bilhões para quase R$ 60 bilhões. Como desatar esse nó?

Palocci tinha uma proposta prontinha quando estava no Ministério da Fazenda. O tsunami do mensalão e sua saída do cargo o impediram de aplicá-la na época. Agora o caminho está livre.

A intenção da proposta é racionalizar a cobrança do tributo à Previdência de forma inteligente, substituindo-o por outro imposto, em que os setores industriais e de serviços, que utilizam intensamente mão de obra, seriam mais desonerados do que os com menos empregados, porque usam capital intensivo - máquinas que substituem o homem.

Setores industriais que empregam muito (têxteis, calçados e móveis) ou de serviços (comércio lojista, restaurantes) pagariam uma alíquota mais baixa do novo imposto. Enquanto siderurgia, veículos, bancos e setor financeiro seriam taxados com alíquotas mais altas.

Faz sentido: o financiamento à Previdência seria mais equânime. É hora de desengavetar a proposta, Palocci.

JORNALISTA E PROFESSORA DA PUC-RIO