O Estado de S. Paulo - 23/02/2011
Há mais ou menos um ano o Instituto Datafolha divulgou uma pesquisa sobre votos facultativo e obrigatório, constatando um empate: 48% dos pesquisados eram favoráveis à manutenção do atual sistema e 48% preferiam que a obrigatoriedade fosse extinta.
Outra constatação foi a de que o número de defensores do voto facultativo aumentara desde o último levantamento, em dezembro de 2008. Na época, 53% eram a favor do obrigatório e 43% do facultativo.
Trata-se de informação relevante, pois reflete uma situação de expressão de vontade do eleitor. A boa notícia é que consta da lista de "temas prioritários" a serem discutidos pela comissão instalada ontem no Senado.
Os outros são os sistemas de voto (proporcional, distrital, misto), financiamento de campanha, suplência de senador, coligações em eleições proporcionais, filiações partidárias, reeleição, candidaturas avulsas, cláusula de desempenho, data da posse de presidentes, governadores e prefeitos e suplência de senador.
A má notícia é que muito provavelmente esse ponto entrou na lista para constar e tem zero chance de ser seriamente levado em conta.
Assim como o voto distrital, ou distrital misto, cujo maior defeito, na visão interna corporis do Congresso, é exatamente criar um vínculo de cobrança e fiscalização entre representantes e representados.
Convenientemente, não faz parte da lista inicial a abertura da internamente esperadíssima "janela" para o troca-troca partidário, que ao longo das discussões, seja no Senado ou na Câmara, certamente será apresentada.
No momento inaugural, de grande regozijo, as excelências não vendem o peixe tal como pretendem embrulhá-lo. Isso ocorrerá no correr dos trabalhos, quando deputados de um lado e senadores do outro começarem a construir os consensos e a eliminar os dissensos.
A pretexto de fazer a reforma "possível" em tempo célere para não dar margem a acusações de que mais uma vez não farão a reforma, os parlamentares deixarão de fora os temas polêmicos.
Entre eles, claro, os que provocariam alterações significativas no sistema. Como o voto facultativo, o voto distrital e principalmente a alteração do tamanho das bancadas para torná-las proporcionais à população de cada Estado.
Agora, por que se ignorarem as complicações, as polêmicas? Por que a pressa, depois de anos a fio de faz de conta na tentativa de fazer a reforma política?
Se o Congresso está mesmo disposto a reformar, deveria dedicar ao assunto o tempo que fosse. A população, assistindo ao debate - e, principalmente, sendo incluída nele - reconheceria o esforço e a seriedade do propósito.
A pressa faz supor que o interesse seja apenas aprovar alterações a tempo de entrarem em vigor para as eleições do ano que vem.
A fuga das polêmicas sugere que o Congresso não queira, não possa, não saiba, não tenha coragem ou não esteja à altura da dimensão do problema que lhe caberia enfrentar com independência, inteligência, desprendimento e respeito ao público.
Livre falar. Os petistas sempre reagiram a quaisquer manifestações de Fernando Henrique Cardoso dizendo que declarações de natureza político-partidária não caberiam bem ao figurino de ex-presidentes.
Esquecidos de que José Sarney é senador, Itamar Franco foi governador, Fernando Collor só não se elegeu antes porque estava legalmente impedido e que Luiz Inácio da Silva um dia viria a ser "ex" sem com isso abrir mão de seus direitos políticos e da prerrogativa de emitir opiniões, dar entrevistas, palestras, discursar. Como todos os outros.
Agora alguns reagem às manifestações do recentemente derrotado candidato a presidente e ex-governador, José Serra, alegando que deveria se calar.
Não parece coerente menos ainda respeitoso para com a opinião alheia. Hoje mandam FH e Serra se calarem. Amanhã, se tiverem força e poder para isso, podem querer retomar projetos de extensão dessa interdição à liberdade geral de expressão. O princípio é um só e vale para todos.