domingo, janeiro 23, 2011

O voto em discussão:: Merval Pereira

Uma reforma no sistema eleitoral à guisa de reforma política está
sendo gestada nos bastidores do futuro Congresso, e essa discussão vem
para valer já no começo da nova legislatura. PT e PMDB vão voltar a
defender o voto em lista fechada, o que daria às direções partidárias
o poder de escolher quais seriam os candidatos, e em que lugar eles
apareceriam na lista oficial.

Não é à toa que os dois maiores partidos do país, detentores das
legendas preferidas dos eleitores, defendem essa modalidade.

Mas os políticos que temem a ditadura dos partidos vão novamente sacar
um argumento poderoso, que inviabilizou a aprovação do voto em lista.
Defenderão junto ao eleitorado que a medida impede que o povo escolha
diretamente seu candidato.

Há ainda uma questão política apimentada na retomada do debate: por
que o PT insiste tanto na defesa do voto em lista, além do fato de ser
um partido hierarquicamente estruturado e bem montado em todo o país?

A adoção do voto em lista fechada é a única maneira de implantar o
financiamento público de campanhas eleitorais, que seria, na verdade,
o grande objetivo da cúpula petista.

Isso porque a tese de defesa do mensalão é que o dinheiro que circulou
entre os políticos era de caixa 2 para a campanha eleitoral, porque o
sistema eleitoral em vigor praticamente conduz a esse tipo de
procedimento.

Como o Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar o processo do
mensalão ainda este ano - caso em que os 40 indiciados, inclusive o
ex-ministro José Dirceu, são acusados de terem montado ou participado
de um vasto esquema de corrupção para compra de votos no Congresso -,
o PT e seus aliados teriam para se defender um bom argumento na
mudança do sistema de financiamento de campanhas.

Tanto é assim que a única mudança que se pretende fazer é no sistema
eleitoral de escolha de deputado e vereador, mantendo-se o sistema
proporcional. Os demais cargos são disputados em pleitos majoritários.

O deputado federal Miro Teixeira, um estudioso dos sistemas
eleitorais, e um dos principais opositores do voto em lista fechada
desde o primeiro momento em que ele foi colocado em discussão, defende
que qualquer que seja o sistema eleitoral, tenha que obedecer ao voto
direto do eleitor.

As dificuldades políticas para aprovar o voto em lista estão fazendo
com que cresça entre os parlamentares que querem mudar o sistema de
votação a proposta do voto distrital.

O PSDB defende o distrital puro, considerando que o misto - onde uma
parte dos deputados continua sendo escolhida pelo voto proporcional -
é de difícil entendimento para o eleitor médio.

Já o PP está defendendo o chamado "distritão", onde cada estado se
transforma em um grande distrito, e os mais votados são eleitos.

O que dificulta a aprovação de sistemas eleitorais que adotem a
divisão dos estados em distritos é o desequilíbrio na representação
popular, com um distrito de 800 mil eleitores em São Paulo e outro de
oito mil no Amapá.

O eleitor dos grandes centros ficaria em desvantagem, seu voto valendo
menos do que o do eleitor de um pequeno estado.

Tendo em vista o pluripartidarismo brasileiro, há também o risco de a
definição da vontade das maiorias ser uma tarefa complexa e polêmica.

Com 21 partidos disputando a eleição em um distrito para uma vaga,
como o eleito representará a maioria?

Cairíamos na contradição de dizer que um sistema majoritário elege um
candidato que tem apenas 15% do eleitorado. A não ser que a eleição
distrital fosse disputada em dois turnos.

No entanto, o voto distrital tem, entre suas vantagens, a de abrir ao
eleitor a possibilidade de trabalhar contra um candidato, o que no
atual sistema brasileiro simplesmente não existe.

As vantagens do sistema distrital majoritário são muitas, segundo os
formuladores do projeto: é simples e de fácil implantação; incentiva a
participação do eleitor, que exerceria maior vigilância e fiscalização
sobre o representante eleito do seu distrito.

Cada partido só poderá apresentar um candidato por distrito, reduzindo
drasticamente o número de candidatos nos estados e no país.

Além disso, o candidato concentrará sua campanha no distrito ao qual
concorre, tendo fim as campanhas eleitorais milionárias em que os
candidatos, no sistema atual, se veem obrigados a fazer campanha em
todo o estado.

O sistema do distritão tem a vantagem de equalizar os sistemas
eleitorais, pois todas as demais eleições já são majoritárias.

E evita a distorção de eleger deputados e vereadores com poucos votos,
por causa da legenda, ou pela coligação.

O distritão até resolve um problema de nosso pluripartidarismo: os
partidos deixarão de ficar enchendo as chapas para amealhar votos para
a legenda e, com isso, ganhar mais cadeiras. Condensa o número de
candidatos e acaba com as coligações. Haveria a valorização dos
melhores quadros, e o tempo de televisão da propaganda eleitoral seria
mais bem aproveitado.

Partidos que só sobrevivem pela coligação desaparecerão, o que,
paradoxalmente, pode funcionar contra a aprovação do distritão.

É como o vestibular e concurso público, os primeiros aprovados entram
até o número de vagas. O senador Francisco Dornelles acha que com a
adoção do distritão haverá uma natural redução dos partidos políticos
no Congresso.

Hoje, nada menos que 21 partidos estão representados no Congresso,
sendo que sete legendas têm quatro ou menos deputados, a maior parte
deles eleita por coligações proporcionais: PHS (2); PMN (4); PRP (2);
PRTB (2); PSL (1); PSOL (3); PTdoB (4).

FONTE: O GLOBO