O Estado de S.Paulo
O resultado da eleição de hoje é incerto, não se sabe se amanhã a campanha recomeça ou se estará decidida a sucessão do presidente Luiz Inácio da Silva, mas uma coisa é certa: a atual campanha presidencial foi a mais esquisita, para não dizer bizarra, de todas as eleições desde a redemocratização.
Inclusive por suas contradições. Por exemplo: foi a menos politizada de todas e, no entanto, a primeira em que a sociedade interferiu concretamente para que fosse tomada uma providência contra os políticos de vida pregressa duvidosa, os chamados fichas-sujas.
Não dá para dizer que não houve avanços se gente que antes circulava de cabeça erguida a despeito do peso da folha corrida, dando de ombros e se lixando, agora está moralmente condenada em praça pública.
Uns renunciaram, outros se expuseram ao vexame de recorrer a "laranjas", muitos perderam votos com a exposição negativa e nenhum deles terá os votos computados hoje. Em princípio esses votos serão considerados nulos.
Posto o monumental ganho, vamos às constatações menos positivas a respeito da campanha que se encerra.
Verdade que, cada qual a seu modo, os candidatos desta vez eram verdadeiros breves contra a luxúria eleitoral.
José Serra, prontíssimo para o cargo, mas zero à esquerda em matéria de "appeal", carisma, borogodó, tenha o nome que for aquilo que atrai e mobiliza as pessoas.
Marina Silva fala de coisas modernas, é elegantíssima nos modos, na fala e no pensamento, põe os dedos em algumas feridas com precisão. Mas o faz com tal delicadeza e adjetivação vã que se torna inaudível e ininteligível.
Plínio de Arruda Sampaio tenta fazer o démodé transgressor, mas o personagem morreu com Leonel Brizola, que o encarnava com charme intransferível.
Dilma Rousseff por enquanto não é nada além de uma criação de Lula, dos conselheiros de forma e conteúdo, do cabeleireiro Celso Kamura. Ensaiada, quando livre parece rude.
Com esse plantel não daria mesmo para se produzir um grande espetáculo. Mas saiu pior que a encomenda. O presidente Luiz Inácio da Silva institucionalizou a transgressão. A oposição a rigor não disputou porque quando entrou em campo o jogo ia longe, e tudo isso já é bem sabido.
Um ponto a respeito do qual pouco se falou e que salta como um dos grandes fiascos da temporada são os debates de televisão. Os candidatos não ajudam? Não, mas o modelo tampouco favorece a um real embate de pensamentos, estilos e personalidades.
Os marqueteiros mandam em tudo. Impõem os interesses dos clientes que jogam com medo de errar e sem vontade de acertar (o fígado do oponente).
Em nome do bom-mocismo, os candidatos estão fingindo que debatem, as emissoras fazendo de conta que promovem debates e o eleitor/telespectador fica no "ora, veja"; feito bobo, até tarde, esperando que aconteça alguma coisa que altere aquela situação totalmente artificial.
Trata-se definitivamente de um modelo esgotado, um formato a ser repensado e remodelado, na próxima eleição, sob pena de caírem em desuso por desinteresse no uso.
Comparativo. Segundo o TSE, 3.162 candidatos tiveram o registro negado pelos tribunais eleitorais, sendo que, destes, 1.248 ainda estão pendentes na instância superior.
Em 2006 o número de candidaturas indeferidas foi de 1.563. Outros 1.030 renunciaram à postulação, somando 2.593 candidatos.
Se todos os vetados agora forem impugnados em definitivo, terá havido aumento, mas não muito grande, de candidaturas tidas como inaptas depois da aprovação da Lei da Ficha Limpa.
Assim é. No debate da TV Globo, quinta-feira, ao fim das considerações finais de cada candidato, as "torcidas" saudaram com palmas as manifestações dos respectivos candidatos. Menos os tucanos. Ficaram em silêncio não se sabe se por excesso de apreço ao veto a manifestações da plateia ou por escassez de entusiasmo.