O Estado de S. Paulo - 23/09/2010
Os Estados Unidos já são uma potência empobrecida? Não é isso o que importa, no momento. E não será apenas a economia que vai definir. Ela pesa muito, sim, mas há outros fatores importantes como quem dispõe de mais navios de guerra, submarinos, aviões, tanques, armas nucleares, homens em seus exércitos dispostos a morrer pela pátria ou pelo império, seja ele qual for, americano, russo ou chinês. Não é apenas a economia que vai dizer quem irá conter o Irã, quando ele tiver a sua bomba atômica. Se fosse isso, o problema já estaria resolvido , pois todos os países, com a bizarra exceção do Brasil e da Turquia, condenam a aventura nuclear iraniana.
O papel dos EUA como potência é tema complexo, polêmico, e está muito bem exposto e analisado na entrevista que o professor Michael Mandelbaum deu à colega Patrícia Campos Mello, publicada no domingo, no Estado. Patrícia soube enfocar os temas geopolíticos mais importantes no momento. Leitura indispensável, assim como o livro de Mandelbaum, The Frugal Superpower.
O que importa agora é avaliar as repercussões imediatas da anunciada "decadência" americana sobre a economia mundial. Convém lembrar que o desafio para evitar a recessão e voltar a crescer não é só dos EUA mas de todos os países desenvolvidos, na Europa, Japão. Juntos, eles representam 56% da economia mundial. Só os Estados Unidos, quase 25%, um peso igual à soma dos 27 países da União Europeia.
É preciso analisar esse cenário sem as distorções de ideologias ultrapassadas.
EUA são muito. Queiram ou não os ideólogos, essa é a realidade incontornável no momento. Há alguns fatos marcantes na economia americana que, mesmo "empobrecida", tem um enorme potencial para voltar a crescer e continuará sendo ainda por muitos anos a peça fundamental na recuperação mundial. Ela representa, sozinha, quase 25% do PIB mundial medido pelo Fundo Monetário Internacional. Outra constatação é que o PIB dos Estados Unidos desacelerou nos últimos meses, mas continua crescendo.
A economia americana poderá crescer mais no próximo ano se o governo confirmar novos pacotes de estímulo que Obama e sua equipe anunciaram nas últimas semanas. Mais de US$ 200 bilhões, por enquanto. Há a oposição do Congresso, mas isso pode ser contornado depois das eleições parlamentares de 2 de novembro.
Pode crescer mais? A resposta é sim, porque os EUA têm a seu favor o potencial de um mercado interno retraído que representa cerca de 70% do PIB, a ser revigorado; um mercado externo ainda por explorar e conta com o apoio de um banco central de um banco central menos ortodoxo, não contracionista e a possibilidade de criar recursos emitindo dólares.
Esse é fator inestimável e único. Podem criar dinheiro rapidamente para investir e estimular a demanda interna. Derrubar sua cotação para que possam exportar mais. É o que fizeram nos últimos meses. Quase US$ 2 trilhões.
Mas a agressividade não para aí. Há hoje 20 missões comerciais americanas com 250 empresários visitando 25 países. A meta é exportar mais, muito mais, para gerar empregos, que são 15% mais bem remunerados no mercado de trabalho interno.
Nada bom para nós. É um caminho que está dando certo para eles, mas não para o Brasil e outros países que vão enfrentar uma competição nova à qual não estavam acostumados. A China pode se defender, nós não. Mas isso parece não ter importância aqui. O ministro Celso Amorim já declarou que está feliz porque agora, sim, dependemos menos dos Estados Unidos. Ou trocamos pela Argentina prestes a substituir os americanos como nosso segundo parceiro comercial. E afirmou isso sem ficar vermelho...
Mas esse é um tema que exige mais espaço e vamos tratar na próxima coluna. Vai assustar.