O Globo - 24/08/2010
A pesquisa feita toda semana pelo Banco Central com instituições financeiras registrou que a expectativa é de juros em 10,75% no fim do ano. Há boas razões para os juros pararem de subir: o IPCA de julho foi zero, o IPCA-15 de agosto, também, e as projeções de inflação estão em queda. No mercado, há quem avalie que a razão é eleitoral. Não acho. Há fundamentos técnicos para o fim do ciclo de alta.
Quando os juros começaram a subir em abril houve reação dentro do governo.
Na época, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disse que juros mais altos não provocariam perdas eleitorais para o governo, mas inflação em alta, sim. A próxima reunião do Copom que será realizada a um mês das eleições pode interromper a elevação da taxa de juros. A interrupção favorece a candidata do governo? Claro que sim. Mas existem sólidos motivos para o fim da alta.
A previsão de inflação este ano está caindo. Era 5,2% há uma semana e foi reduzida para 5,1%, nesta. Para 2011, as projeções são de uma inflação ainda mais perto da meta: 4,86%. As estimativas subiram um pouquinho na última pesquisa e até consideram uma elevação dos juros no ano que vem. Mas não há sinais de aceleração inflacionária.
Tudo permite ao Banco Central uma suspensão no aumento da Selic.
No início de setembro, logo após a reunião do Copom, o IBGE vai divulgar o PIB do segundo trimestre e ele mostrará uma desaceleração.
Os primeiros sinais do terceiro trimestre indicam que o nível de atividade voltou a subir. O mercado interno continua aquecido, as exportações mais fortes são apenas as de matériasprimas, mas o país continua com superávit comercial.
Tendo em mãos os indicadores antecedentes, os economistas fazem previsões para o PIB do segundo trimestre. O Itaú Unibanco aposta em 0,6%. O mesmo da projeção divulgada ontem pelo Serasa Experian. A Tendências acha que pode ficar em torno de 0,4%. Todos eles preveem um crescimento maior no terceiro trimestre: 1,2%, a Tendências; 1,1%, a MB Associados.
A indústria voltará a crescer, depois de cair 2% no segundo trimestre, acumulando perdas por três meses seguidos. É fácil de entender.
O consumo cresceu muito no começo do ano, aproveitando a onda da redução dos impostos. A indústria antecipou a produção para atender à antecipação do consumo e depois reduziu o ritmo para não acumular estoques. Em julho, os dados já mostram um ritmo maior. Ontem, saiu o crescimento do consumo de energia de 13,7% em relação a julho do ano passado. Caiu 0,5% em relação ao mês anterior, mas isso não estava no release da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Mas o consumo industrial subiu na margem em 1,6%.
— Estamos, sem dúvida, acelerando de novo. Mas longe de se esperar um cenário de aquecimento como o do primeiro trimestre porque acabaram os incentivos fiscais e aumentaram os juros.
Os condicionantes da demanda são fortes como renda, crédito, emprego e confiança do consumidor e dos empresários. O terceiro trimestre será um meio termo entre os dois primeiros — disse Bernardo Wjuniski, da Tendências.
A MB está prevendo uma inflação de 5% este ano, mas acha que pode ser menos.
Segundo o economista Sérgio Vale, como se espera zero de inflação para agosto, a inflação poderia ficar em até 0,44% ao mês até o fim do ano para fechar em 5%. Por isso, ele também acredita que o Banco Central vai interromper a alta de juros. O que a consultoria prevê é que a médio prazo o crescimento pode encontrar o obstáculo do déficit em transações correntes.
Ontem, o Banco Central divulgou o déficit de julho, de US$ 4,5 bilhões, e ele foi o pior para o mês desde 1947. O acumulado em 12 meses está em 2,2% do PIB, o que é um percentual crescente, mas bem abaixo do que em outros momentos em que o país enfrentou crise.
Isso sem falar nas reservas cambiais de US$ 256 bilhões.
O problema é que sustentar um déficit externo aumentando e, com ele, financiar o crescimento econômico sempre esbarra em limites.
Há muitas distorções na forma escolhida pelo governo para manter o crescimento e eu tenho falado desses problemas aqui na coluna. Hoje, as análises externas comemoram o crescimento brasileiro, mas sempre apontam os riscos de ele não ser sustentável, principalmente pelos gargalos fiscais óbvios.
No curto prazo, o país continuará, no entanto, crescendo e com inflação baixa, o que justifica a decisão que o Banco Central pode vir a tomar na semana que vem de interromper a escalada dos juros.
O economista José Márcio Camargo, da Opus Gestão de Recursos, não acha que um ritmo maior do nível de atividade seja um problema para o Banco Central.
— O crescimento nos próximos quatro trimestres dará uma média anual em torno de 4%. Isso é bem diferente do ritmo acima de 7% que o Brasil está tendo este ano — diz.
A arrecadação federal de julho, divulgada na semana passada, teve um aumento de 10,8% em relação a julho de 2009, e de 12,2% no acumulado do ano. O governo tem aumentado as despesas baseado nesse quadro favorável, que não é eterno. Nos próximos meses, segundo o Itaú Unibanco, há riscos de redução no superávit primário por causa da forte expansão do gasto.