O GLOBO - 20/08/10
A candidata do Partido Verde Marina Silva começou, no debate pela internet da “Folha de S. Paulo” e do UOL, a explicitar uma nova estratégia de campanha, mas muita gente confundiu seus primeiros passos com uma adesão antecipada à candidatura do PT, como se esse fosse um movimento quase que natural de quem esteve naquele partido nos últimos 30 anos.
Mas quem apostar que a estratégia da candidata Marina Silva será fazer dobradinha com a petista Dilma Rousseff, atacando o tucano José Serra, está enganado.
O que aconteceu nesse sentido terá sido apenas fruto de circunstâncias daquele debate, e não é uma estratégia de campanha.
É possível que mais adiante, aos poucos, como é seu estilo, Marina deixe claro mais pontos de desacordo com o governo petista que abandonou depois de mais de cinco anos no Ministério do Meio Ambiente.
Mesmo porque um dos pontos mais fortes do discurso de Marina foi justamente em cima do presidente Lula e de sua candidata Dilma Rousseff, ao dizer: “Estão querendo infantilizar os brasileiros com essa história de mãe e pai.” Aliás, a frase fez tanto sucesso que foi usada ontem por Marina na visita que fez à Bolsa de Valores em São Paulo: “O Brasil precisa de uma discussão madura sobre seu futuro. Os brasileiros não podem ser tratados de forma infantilizada”, reafirmou.
É verdade que os coordenadores de sua campanha acreditam que “uma janela de oportunidade” pode se abrir caso a candidata oficial continue se distanciando do tucano José Serra nas pesquisas eleitorais, fazendo os eleitores começarem a pensar que quem ainda tem condições de derrotar Dilma é Marina.
Mas, mesmo que o objetivo imediato da candidata do Partido Verde seja superar Serra para ir para o segundo turno contra a candidata oficial, a estratégia teria que ser mostrar ao eleitorado que hoje escolhe Serra que também Marina é uma crítica do governo, ou pelo menos de Dilma, e se coloca como uma alternativa ao PT que está no poder.
Por isso, ontem ela esclareceu que sua preocupação “não é em criar constrangimento para o Serra nem para a Dilma, e sim criar um constrangimento ético para o Brasil”.
A senadora Marina Silva tem o cuidado de não criticar diretamente o presidente Lula, de quem faz questão de se dizer amiga.
Essa postura permite que ela tente ser uma opositora do PT sem atingir o presidente, abrindo espaço para que eleitores petistas que hoje votam em Dilma pensem nela como opção.
Segundo o Datafolha, Marina tem 15% no Rio de Janeiro, acima de sua média nacional, que fica em torno de 10%, enquanto Serra tem 25%.
O Partido Verde está convencido de que o Rio de Janeiro pode ser a plataforma de lançamento de Marina no plano nacional, o primeiro lugar em que ela passará Serra, viabilizando uma arrancada rumo ao segundo turno, embora tenham os pés no chão e saibam que o eleitorado do Rio não representa o brasileiro.
Além dos votos da classe média que poderão migrar de Serra, na área popular, os votos, sobretudo entre as mulheres pobres, migrarão tanto de Dilma como de Serra, imaginam os coordenadores da campanha.
O cientista político Nelson Rojas de Carvalho, da Universidade Federal Rural do Rio, ligado ao prefeito Cesar Maia, especialista em pesquisas de opinião, vem encontrando na Região Metropolitana do Rio, sobretudo em Nova Iguaçu, Caxias e São João de Meriti, eleitores de classes C e D que começam a prestar atenção em Marina por uma pauta de valores, percebendo-a como a mais preocupada com os pobres e contra a corrupção.
Para ele, o tema de meio ambiente teria que ser ampliado para outros valores que ela encarna, como críticas ao desvirtuamento do PT e o combate à corrupção, se quiser aumentar sua área de contaminação eleitoral.
Na percepção do eleitorado, ela tem autoridade para empunhar essa pauta de valores.
Na análise de Nelson Rojas de Carvalho, a racionalidade de uma aproximação centrista supõe um eleitor informado, mas é ininteligível para o eleitor de baixo grau de informação.
Não havendo diferenciação entre os candidatos, se a oposição é igual ao governo, para o eleitor médio é melhor manter o que já existe.
A despolitização do debate é uma política boa para quem está no governo. Temas dicotômicos que marcariam a oposição teriam maior rendimento eleitoral, analisa Carvalho, e aglutinariam as bases oposicionistas.
“Se ele não se diferenciar da Dilma, essa base pode migrar para Marina”, diz, referindose ao candidato tucano José Serra.
Se a maior definição dos candidatos, determinada pela vantagem da candidata oficial nas pesquisas de opinião, for a tônica dos programas de propaganda eleitoral, poderemos ver uma mudança de estratégia interessante.
O candidato tucano José Serra, que torce para que Marina mantenha-se em torno dos 10% para tentar garantir o segundo turno, terá que manter um olhar atento à retaguarda para não ser surpreendido por uma ultrapassagem que ainda parece improvável.
Mesmo não tendo uma estrutura partidária tão ampla quanto a da base governista, e sofrendo com problemas de arrecadação de fundos para a campanha, que se agravam à medida que a vantagem da candidatura oficial aumenta, o PSDB ainda é o único contraponto viável ao governo, e o tempo de propaganda oficial no rádio e na televisão isola a candidatura de Marina em pouco mais de um minuto.
Serra elevou o tom de suas críticas ao governo, de maneira a marcar a posição de oposicionista, mas se a “cristianização” de que parece estar sendo vítima não for estancada, com os candidatos nos estados simplesmente deixando de incluí-lo em suas propagandas na televisão, sua candidatura pode ser inviabilizada de vez.