O Estado de S.Paulo - 20/04/2010
A posição de José Serra sobre o fim da reeleição e instituição do mandato único de cinco anos para presidente da República é antiga e conhecida.
Estrategicamente ele escolheu o dia de ontem quando visitava Minas Gerais para voltar a defender a tese que há algum tempo havia arquivado.
Durante boa parte do segundo mandato do presidente Luiz Inácio da Silva, Serra se dedicou a articular a apresentação de uma emenda para revogar a reeleição, conversou realmente em duas ocasiões a respeito com o presidente e havia até marcado data para deflagrar o processo: logo após a eleição municipal de 2008. Mas desistiu por dois motivos.
Primeiro, porque Fernando Henrique Cardoso o convenceu de que não era conveniente mexer em questões institucionais que pudessem ensejar brechas para alterações na Constituição com vistas à possibilidade de um terceiro mandato.
Segundo, porque recebeu de um interlocutor o recado de que o presidente Lula não estava mais interessado no fim da reeleição. Motivo alegado: não iria "ajudar" o PSDB a organizar a sua fila de candidatos a presidente.
Em miúdos: na percepção de Lula, que na ocasião ainda esperava contar com a divisão do PSDB e quem sabe até com a saída de Aécio Neves do partido, o fim da reeleição encurtaria o horizonte de possibilidade de o mineiro ser candidato a presidente e consolidaria a unidade do PSDB.
Relatados os antecedentes, estabelecido que a proposta não é fruto de artifício de momento, ainda assim, vamos e venhamos: é de uma conveniência abissal que seja ressuscitada justamente no dia em que Serra vai a Minas iniciar seu périplo de conquista do segundo e mais importante colégio eleitoral.
O tipo da coincidência muito bem coincidida. Com reeleição, o horizonte de Aécio para ser candidato a presidente é de oito anos. Sem ela, passa a ser de cinco a partir de 2011.
Pode não ser item de acordo para vice. Mas pode ser que seja. Não sendo, é motivo de incentivo ao eleitorado de Minas que acreditou no que não havia - a chance de Aécio ser candidato agora - e precisa de uma chama que lhe aqueça o entusiasmo.
Rio 90 graus. O governador do Rio, Sergio Cabral Filho, tem mantido silêncio em público. Mas é de se conferir por quanto tempo fará olhar de paisagem à cenografia do ex-correligionário e agora arqui-inimigo Anthony Garotinho.
Garotinho lançou-se no fim de semana candidato ao governo do Estado pelo PR. Dias atrás recebeu a visita e ganhou afagos da candidata do PT a presidente, Dilma Rousseff.
Cabral é forte na capital, mas Garotinho é mais forte no interior. Portanto, ela precisa dos dois. Ocorre que o ex-governador deu a largada apostando no vale tudo: exigiu a presença de Dilma em seu palanque e ainda deixou claro que o foco de sua campanha é lançar sobre o governador acusações de corrupção.
"Vou enfrentar a quadrilha instalada no Palácio Guanabara", desafiou Garotinho, cujos bens já foram bloqueados pela Justiça Eleitoral por suspeita de desvio de recursos para campanhas.
O governo federal, por intermédio do então ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, havia avisado a Garotinho no ano passado que precisava de seu apoio, mas não tinha como lhe assegurar um voto, embora o governo tivesse meios de subtrair-lhe muitos.
Ou seja, Dilma já avisara que não subiria em seu palanque.
Antes de lançar sua candidatura e de receber Dilma, Anthony Garotinho espalhou Rio de Janeiro afora que trataria Cabral na base dos dossiês. Obviamente isso era de conhecimento do governo federal.
É um jogo obscuro. Para dizer a coisa de forma bastante amena.
Papéis trocados. Os presidentes do PSDB e do PT, Sérgio Guerra e José Eduardo Dutra, deram entrevistas sobre erros e acertos das campanhas, mas praticamente só falaram do adversário.
Foram loquazes na interpretação das ocorrências na seara do oponente, mas se esqueceram de vender o peixe dos respectivos candidatos.