sexta-feira, março 19, 2010

EDITORIAL de O GLOBO Círculo vicioso

O GLOBO - 19/03/10

A divisão do Conselho de Política Monetária, Copom, expressa na decisão de manter os juros básicos em 8,75% por cinco votos a três — por um voto não houve empate — reflete a divergência de leituras da conjuntura econômica.

Há indiscutíveis pressões inflacionárias — já se projeta para este ano uma taxa próxima de 5%, meio ponto percentual acima do centro da meta —, porém persistem dúvidas sobre a efetiva contribuição dos reajustes sazonais de início de ano para estas pressões, assim como das fortes chuvas ocorridas no período e seus efeitos na agricultura.

Entende-se, porém, com base no resultado da reunião deste mês do Copom , que em abril reabrese mais um ciclo de alta dos juros. Se há dúvidas sobre as causas da alta de preços no início do ano, não se diverge acerca do aquecimento da economia, sinalizado, aliás, pelo comportamento do PIB no último trimestre do ano passado, com base no qual estimase um crescimento para 2010 entre 5,5% e 6%.

O país volta a padecer da síndrome do "voo de galinha", saltos do PIB de curto alcance. No passado, o dinamismo da economia brasileira esbarrava em déficits externos, risco afastado — mas não superado — com o aumento das exportações, acumulação de reservas e atração de capitais. Hoje, o principal freio são as deficiências na infraestrutura e uma reduzida taxa de investimento — aquém dos 20% do PIB —, incapaz de ampliar a capacidade de produção para atender a uma demanda crescente. Com isso, os preços sobem, e o Banco Central precisa agir e elevar os juros. O círculo se fecha e tudo começa mais uma vez até a próxima necessidade de um aperto monetário.

Este cenário econômico medíocre se assenta em um Estado voraz, o qual, por meio de impostos, confisca mais de 35% do PIB — e mesmo assim não investe o que deveria na infraestrutura. A prioridade nos gastos é com a máquina burocrática, assistencialismo e a previdência, esta por decorrência da política de valorização do salário mínimo, indexador do benefício previdenciário básico, entre outras razões. De 1999 ao ano passado, em dez anos, portanto, as despesas públicas totais cresceram 4,2% do PIB. Ou seja, bem mais que a economia. Já os investimentos públicos, apenas 0,6%.

O confisco que o Estado executa nas rendas da sociedade também atua como camisa de força nos investimentos privados.

É assim que se instala este círculo vicioso de crescimento não sustentado