Embora com implicações políticas e institucionais menores, a decretação da prisão temporária do governador de Brasília, José Roberto Arruda (sem partido, ex-DEM), equivale, do ponto de vista da História, à destituição de Fernando Collor da Presidência da República, por impeachment votado no Congresso.
Naquele ato político, não muito tempo depois do fim da ditadura, a República deu grande demonstração de maturidade, encerrando um longo ciclo em que as Forças Armadas se arrogavam o papel de "poder moderador"; agora, as instituições marcam território diante de uma conjuntura de séria deterioração dos costumes na vida pública. Algo como o "basta!" pelo qual a nação tanto clama.
Não importa se é apenas uma prisão temporária. Conjugada com a abertura de processo, no STF, contra a "organização criminosa" do mensalão do PT e aliados — termo também usado no julgamento, no Superior Tribunal de Justiça, do pedido de prisão de Arruda —, a decisão de quinta-feira do STJ institui um referencial para as imprescindíveis faxina e dedetização da vida pública. Arruda se sentiu protegido, longe do alcance da Justiça, do Ministério Público e da Polícia Federal, pois manteve total controle da Câmara Legislativa, onde transitam alguns dos beneficiários do dinheiro sujo recolhido em propinas cobradas a empresas prestadoras de serviços ao governo — esquema clássico de corrupção. Ele fez uma aposta e perdeu. O ex-governador, também afastado do cargo no histórico voto do ministro Fernando Gonçalves, acompanhado pela maioria da Corte Especial do STJ, chegou ao ponto de tentar subornar uma testemunha do esquema, o jornalista Edmilson Edson dos Santos, o Sombra, por meio de um emissário, preso pela PF. Tudo devidamente registrado em vídeo, como também o foram vários pagamentos com o dinheiro das propinas, inclusive ao próprio Arruda.
A coação de testemunhas, para prejudicar a Operação Caixa de Pandora, de desmantelamento, pela PF, da indústria da corrupção montada no governo Arruda, foi decisiva para a decisão do STJ e a manutenção da prisão pelo ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo. Para fechar definitivamente o cerco ao esquema, o Ministério Público Federal, depois do êxito no pedido de prisão preventiva, deseja intervenção federal em Brasília. Faz sentido.
Ao contrário da declaração de Lula sobre supostos efeitos negativos para a imagem do país, a prisão de Arruda dá esperança de que as instituições consigam debelar a crise ética na vida pública, ao abalar a cultura da impunidade reinante no meio político