O GLOBO
Não é só o modelo de exploração do petróleo do pré-sal que está atrasado. Há vários outros temas igualmente estratégicos, exigindo, pois, regras de longo prazo, que continuam enrolados no governo Lula. Em todos os casos, o resultado é o mesmo: atrasos em investimentos em infraestrutura.
Eis alguns exemplos, no noticiário desta semana: • Já venceram ou estão vencendo prazos de concessões de portos, sem que estejam definidas as regras para renovação ou novas licitações.
• Vencem em breve concessões de usinas hidrelétricas, na mesma indefinição.
• Permanece uma enorme confusão jurídica em torno de licenças ambientais, atrasando obras diversas, de estradas a hidrelétricas.
Tome-se o caso das concessões que estão vencendo. Os atuais concessionários não investem porque, afinal, podem perder o negócio. E eventuais novos investidores, que poderiam disputar as concessões, não se preparam, o que requer gastos, porque, afinal, não sabem se haverá novas licitações.
Esses modelos institucionais são necessariamente complexos. Sua definição exige desde a formulação de cenários econômicos de 30 anos até escolhas políticas. No primeiro caso, trata-se de competência técnica. No segundo, de clara orientação.
Como o governo Lula tem uma composição muito heterogênea, em todos esses assuntos estratégicos aparece sempre uma discussão ideológica: o governo assume ou privatiza de alguma maneira? Foi assim, por exemplo, no caso das rodovias federais. O governo gastou vários anos discutindo o modelo, até se fixar pela concessão simples a empreiteiras privadas, mas com uma fórmula técnica que procurava levar à menor tarifa, isto sendo uma espécie de compensação pela privatização (a propósito, já há problemas nesse esquema, com a tarifa menor reduzindo a capacidade de investimento do concessionário, mas isso é outra história).
Por aqui, interessa notar que esse debate se repete em todas as instâncias do governo porque o presidente Lula não determina uma orientação básica. Vai no caso a caso, conforme as forças políticas e os lobbies alojados neste ou naquele ministério.
Ocorre também com as licenças ambientais. É evidente que há divergências de natureza estratégica no governo. Uma estrada ou uma hidrelétrica no meio da Amazônia geram enormes impactos ambientais, conforme todos estão de acordo. Também há um bom consenso em torno da tese de que as compensações ambientais, sempre possíveis, são também incompletas, apenas remendos.
A briga está na questão de fundo. Para um lado, o tamanho do impacto desqualifica e exclui projetos. Para outro, os benefícios econômicos e sociais, incluindo os ganhos de emprego e renda para populações locais, justificam as obras. Ora, a legislação ambiental no Brasil é fortemente restritiva, mas, como sempre acontece, parece ter buracos que permitem certos licenciamentos obtidos mais por força política.
O que, de novo, leva ao caso a caso.
E vai parar na mesa do presidente Lula, que parece fazer de tudo para não decidir e esperar que o "pessoal" se arrume. E por que faz isso? Para manter o que alguns chamam de ampla base de apoio. Assim, a ministra Dilma quer a estrada, o ministro Minc não quer. Ambos vão ao presidente e saem de lá contando com o apoio de Lula. Quem leva? Digamos que haja empates, ora um ganhando, ora o outro. Pode parecer equilibrado, mas não é. É perda de tempo e de energia em um processo de decisão desgastante e que gera insegurança jurídica. Podem notar: mesmo no caso de usinas que já foram licitadas e licenciadas, os concessionários continuam brigando nos tribunais contra liminares e embargos, às vezes de dentro da administração.
Situações assim se repetem nas questões que envolvem preservação ambiental e agricultura. No caso do petróleo, então, o contencioso é amplo: estatização versus concessões privadas; exclusividade da Petrobras ou licitações abertas; mais dinheiro para o governo federal ou para estados e municípios.
Se o presidente Lula definisse uma orientação estratégica e política, tudo seria mais simples. Mas qual é, hoje, a sua linha doutrinária? Nem ele parece preocupado com isso. São questões de 30 anos, não afetam as pesquisas de opinião.