quarta-feira, abril 29, 2009

Obama e seus primeiros 100 dias Celso Ming


 ESTADO DE S. PAULO

Desde o presidente Franklin Roosevelt, empossado em 1938, imagina-se que os primeiros 100 dias de mandato de um presidente dos Estados Unidos sejam um tempo não só de trégua e de abstenção de críticas, como, também, uma espécie de avant-première do que virá nos anos seguintes.

O presidente Obama assumiu em condições particularmente adversas, com duas guerras malparadas (no Iraque e no Afeganistão) e com a maior crise financeira desde os anos 30. Nenhum chefe de Estado americano começou com problemas tão complicados. A partir do desempenho na área econômica podem-se fazer três observações destes 100 dias.

A primeira tem a ver com a maneira como o governo Obama passou a administrar o problemão dos bancos. O governo anterior vacilou demais. O então secretário do Tesouro, Henry Paulson, fez duas manobras desastrosas. Tentou adquirir os ativos podres de grandes bancos, mas viu que ficou impossível definir preço para eles. Depois, tentou capitalizar os bancos, mas a falta de clareza sobre o volume de ativos que deixariam de ser honrados pelos tomadores de crédito impediu que se soubesse de quanto seria a injeção de capital. A segunda manobra desastrosa foi deixar que o Lehman Brothers afundasse, o que rompeu acordo sigiloso entre governos, que exigia intervenção e socorro ilimitado a instituições cuja falência pudesse deflagrar quebra em série de outros bancos (risco sistêmico).

A administração Obama, por meio do novo secretário do Tesouro, Tim Geithner, decidiu avaliar melhor o acervo podre dos bancos promovendo testes de estresse. Em seguida, os ativos seriam oferecidos à iniciativa privada e o Tesouro se encarregaria de capitalizar o banco de forma a dar cobertura à parcela dos ativos sob alto risco de calote. Esse processo ainda está em curso, mas revelou ser resposta mais adequada do que as anteriores.

A segunda observação sobre estes 100 dias é de que o discurso eleitoral a respeito da questão trabalhista não vai ser cumprido, ao menos como foi entendido antes. Durante a campanha, o então candidato Obama avisou que daria prioridade à preservação e à criação de empregos e que defenderia os sindicatos. E foram das centrais sindicais que provieram as maiores contribuições à sua campanha. No entanto, ao lidar com a crise das montadoras, a administração Obama deu prioridade, sim, ao emprego, mas de forma diferente. Para salvar a GM e a Chrysler (e, portanto, dezenas de milhares de empregos) teve de exigir fechamento de fábricas e de postos de trabalho. Só a GM está agora desativando 14 fábricas e demitindo 21 mil funcionários. E os sindicatos foram obrigados a desistir de antigas "conquistas trabalhistas", especialmente na área do seguro-saúde.

Finalmente, tem de ser dito que, se não fracassou, Obama não foi tão bem-sucedido na sua primeira grande atuação internacional como chefe de Estado. Na reunião de cúpula do Grupo dos 20 (G-20), dia 2 de abril em Londres, os dirigentes políticos se comportaram mais como celebridades do que como estadistas. Produziram linda peça de comunicação cujas consequências práticas talvez tenham pouco a ver com o texto. No mais, nem Obama convenceu os dirigentes europeus a gastarem mais para acabar com a crise nem eles conseguiram persuadi-lo a repensar o sistema financeiro global.

Confira

No escuro - Há os que apostam em que o Brasil acabará sendo beneficiado e há aqueles que temem pela forte quebra no consumo e na exportação de carnes de todo o tipo.

Ontem, os exportadores passaram o recibo de que já se julgam atingidos. O empresário Pedro de Camargo Neto pediu que a OMS mude o nome da gripe suína para gripe norte-americana.

A esta altura, ninguém consegue mudar mais nada. E, mesmo se os documentos usarem nome mais chique e menos chiqueiro, prejuízos e vantagens provenientes de designação errada ou não já estão dados.