segunda-feira, março 23, 2009

RUY CASTRO Ser ou parecer legal

FOLHA DE S PAULO
RIO DE JANEIRO - Quem assistiu a "O Poderoso Chefão", vol. 1, e se lembra do personagem de Robert Duvall, sabe como essas coisas funcionam. Chega um momento em que o crime precisa formar agentes "caretas" e com fachada legal para se expandir. No caso, Duvall interpreta o filho adotivo da família Corleone, encarregado de defendê-la como advogado.
O crime não pode depender de profissionais recrutados fora -é o que, pelo visto, também já descobriram por aqui. Por isso, a cada ano, haverá mais jovens nascidos no tráfico disputando vagas nas faculdades de Direito e, em futuro breve, nos tribunais, como advogados, juízes e desembargadores. Já não basta ao ilegal parecer legal. Tem de ser legal também.
Da mesma forma, o tráfico descobriu que sai mais em conta formar os seus próprios parlamentares do que comprar políticos no varejo para fazê-los passar os projetos e leis de seu interesse. Não que os políticos deixarão de ser comprados -a oferta se renova a cada eleição. Mas, num mundo ideal para o crime, nada como ter os seus próprios quadros em funções-chave.
Isso implica também o tráfico formar administradores, capazes de criar firmas insuspeitas, de imiscuir-se nas corporações e de trabalhar em estreita intimidade com os diversos níveis de governo, quem sabe participando deles -atividades essenciais para a lavagem dos bilhões gerados pela droga.
Com toda essa profissionalização, o tráfico ainda continuará a depender do homem que vai buscar a carga no mar ou na fronteira, do chefe da boca-de-fumo e do traficante pé-de-chinelo, sem contar os "soldados" que defendem o morro ou a periferia. Mas, não demora muito, os mais insignes profissionais da droga deixarão para trás na escala social os usuários de seus produtos.