sábado, março 21, 2009

Rio de Janeiro Rocinha: a batalha pela ordem

A batalha pela ordem

A prefeitura do Rio tenta demolir um prédio construído por empresário na Rocinha. A pobreza serve de fachada para a especulação imobiliária que tomou conta das favelas


Ronaldo Soares

Fotos Ricardo Leoni/Ag. O Globo e Marcelo Piu/Ag. O Globo

O INFILTRADO
O prefeito do Rio, Eduardo Paes, vistoria o prédio na Rocinha. O vereador Claudinho da Academia (à dir.) o acompanha, mas seus assessores trabalham para os especuladores

O edifício horizontal, em final de construção, que se vê na foto acima fica na favela da Rocinha, na Zona Sul do Rio de Janeiro. Ele está sendo erguido como investimento, para aluguel de suas 22 unidades – quatro apartamentos e dezoito cubículos, estes com 16 metros quadrados cada um. O prédio tem vista privilegiada. Das janelas, avistam-se o Morro Dois Irmãos, a Praia de São Conrado e a Pedra da Gávea. A prefeitura não deu licença para a obra e chegou a multá-la quatro vezes. Com razão. Esse tipo de empreendimento naquele local configura especulação imobiliária e incentiva a expansão da favela. Também contou na decisão a insalubridade dos cômodos minúsculos. Na semana passada, o prefeito Eduardo Paes anunciou sua demolição, mas a Justiça entrou em cena para impedi-lo. A juíza Regina Passos concedeu uma liminar suspendendo a derrubada e afirmou que de nada adiantaria a "atuação midiática de demolição de um prédio, isoladamente, no universo de construções irregulares daquele bairro sui generis". Traduzindo, se tudo é irregular e insalubre, não há por que proibir mais um empreendimento nos mesmos moldes.

Levado ao extremo, esse mesmo argumento poderia ser usado para impedir a prisão de um bandido, visto que a "ação isolada" não acabará com a violência de uma cidade inteira. O prefeito Eduardo Paes afirmou a VEJA que o responsável pelo empreendimento é o comerciante Rodrigo Carvalho, dono de uma lanchonete no campus da Pontifícia Universidade Católica e morador da Gávea, bairro de classe média alta na Zona Sul do Rio. Até aqui, quem se apresentava como dona do imóvel era Maria Clara dos Santos, conhecida como MC Boquinha. Por ser moradora da favela, ela dava a capa de legitimidade (social, é claro) à construção. Diante da ameaça de demolição, descobriu-se que os advogados que assinam o pedido de liminar são assessores do gabinete do vereador local, Claudinho da Academia (PSDC). Ainda há quem considere a expansão das favelas no Rio de Janeiro um problema decorrente apenas da má distribuição de renda. O episódio revela que ela ocorre, também, por uma perversa distribuição de lucros.