sábado, março 21, 2009

História Dúvidas sobre os autores dos manuscritos do Mar Morto

Busca pelo autor

Historiadora israelense rejeita a versão de que os
essênios escreveram os Manuscritos do Mar Morto.
Para ela, a seita de judeus ascetas nem sequer existiu


Thomaz Favaro

Richard T. Nowitz/Latinstock
AS CAVERNAS DE QUMRAN Pesquisadora com um fragmento dos manuscritos e o local onde foram encontrados, no deserto

Foto Hanan Isacha/ Latin Stock

Entre os 930 textos encontrados por um pastor beduíno nas cavernas de Qumran, no deserto da Judeia, em 1947, estão a versão mais antiga do Velho Testamento (completa, com a exceção do Livro de Ester) e uma variedade de comentários místicos. Conhecido como Manuscritos do Mar Morto e datados de 250 a.C. ao ano 65, o material tem ajudado a entender melhor o judaísmo do passado e as origens do cristianismo, o que faz dele um dos principais achados arqueológicos do século XX. Em parte já reconstituídos e publicados, os manuscritos são objeto de discórdias e acalorados debates acadêmicos. A maioria dos estudiosos acredita que foram produzidos por membros de uma seita de judeus ascéticos, chamados essênios. Uns poucos acham que os essênios nada têm a ver com o assunto, e há quem diga que a seita jamais viveu no deserto. A israelense Rachel Elior, professora de misticismo judaico na Universidade Hebraica de Jerusalém, surge agora com uma explicação radical: ela diz que os essênios jamais existiram.

Depois de dedicar uma década ao estudo dos manuscritos, Elior, que é uma respeitada historiadora, concluiu que os textos pertenciam a um clã de sacerdotes conhecidos como saduceus, e que os essênios não passam de uma ficção literária criada pelo historiador judeu Flávio Josefo, que viveu em Roma no século I. Ela argumenta que a versão fantasiosa foi acatada como verdade desde então, mas que não há uma só menção aos próprios essênios nos manuscritos: "Ao contrário, os autores identificam-se claramente como sacerdotes, filhos de Zadoque". Os saduceus foram banidos de Jerusalém no século II a.C., e Elior acredita que os manuscritos são parte da biblioteca do templo levada por eles para um esconderijo seguro no deserto. Descrições dos essênios feitas por antigos gregos e romanos afirmam que havia milhares deles vivendo em comunidade e que evitavam o sexo. Isso chama atenção, pois ia contra a exortação bíblica de "crescei e multiplicai-vos", respeitadíssima no judaísmo. "Não faz sentido milhares de pessoas terem vivido em desacordo com a lei religiosa e não haver menção alguma a elas em textos ou fontes judaicas do período", argumenta Elior. Os detalhes de sua teoria estarão no livro Memory and Oblivion (Memória e Esquecimento, em tradução livre), que será publicado no próximo mês.

"Quase tudo já foi sugerido para explicar a identidade dos autores dos manuscritos e dos antigos habitantes da região de Qumran, mas esta é a primeira vez que alguém afirma que os essênios são uma mera ficção literária", disse a VEJA o historiador israelense Steve Fassberg, diretor do Centro Órion de Estudos dos Manuscritos do Mar Morto, da Universidade Hebraica de Jerusalém, que discorda da tese da colega. Elior não cede aos críticos. "A maioria de meus oponentes só leu Josefo e outras referências clássicas sobre os essênios", diz. "Deveriam ler os Manuscritos do Mar Morto. Neles está a prova."