sexta-feira, março 27, 2009

A busca da unidade Merval Pereira

O GLOBO

Tudo indica que fracassará mais uma tentativa de malabarismo político do PSDB para alcançar a tão necessária unidade partidária para a disputa presidencial de 2010, que deve ser cruenta. Como fica cada vez mais claro que não há tempo nem consenso para mudar a atual legislação que permite a reeleição dos mandatos executivos, já se movimentam os tucanos para montar um compromisso generalizado entre seus principais líderes, e que incluiria também os aliados oposicionistas do DEM e do PPS, no sentido de que seus prefeitos e governadores eleitos em 2010, e eventualmente o presidente da República, não se candidatem à reeleição.

Tal movimento teria um significado político: o de permitir que o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, vislumbrasse uma chance de concorrer à Presidência da República em 2014, abrindo o caminho para a candidatura do governador de São Paulo, José Serra, à sucessão de Lula.

Seria a explicitação da mesma tática que o PT supostamente adotará em relação a Lula. A chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, a que é boa candidata tanto para ganhar quanto para perder, na definição do presidente, teria um pacto implícito com Lula de não se candidatar à reeleição, caso venha a ser eleita em 2010, abrindo espaço para que ele volte a disputar a Presidência em 2014.

Nada indica, porém, que essa seja uma estratégia política viável, a começar por sua abrangência e informalidade.

Não resistiria a uma consulta ao Tribunal Superior Eleitoral feita por qualquer um das centenas de prefeitos eleitos, pois, persistindo na legislação eleitoral o instrumento da reeleição, os eleitos estarão no direito de usá-lo, mesmo que tenham assinado documento partidário se comprometendo a não concorrer.

Há diversos exemplos, alguns recentes, que mostram que esse tipo de compromisso nunca é cumprido. Em Brasília, o governador José Roberto Arruda lidera as pesquisas para 2010, mas consta que teria assinado um documento se comprometendo a não se recandidatar, para que seu vice, Paulo Octávio, disputasse o governo.

Há ainda quem diga que esse compromisso foi firmado pela direção do DEM. O fato é que o tal papel não apareceu, e Arruda está em campanha pela reeleição.

Outro caso famoso é o do ex-senador Roberto Saturnino, que se elegeu senador em 1998 pelo Rio de Janeiro, em aliança do PSB, seu partido na época, com o PDT e o PT.

Pelo acordo, formalizado em uma carta assinada por ele e seu suplente, Carlos Lupi, atual ministro do Trabalho, cada um ficaria no Senado por quatro anos. Saturnino reconheceu a existência do acordo, mas argumentou, para permanecer no posto até o fim do mandato, que o cenário político mudara nos últimos anos.

No caso do PSDB, há o inconveniente, para Aécio, da provável volta de Lula à cédula em 2014. No caso do PT e do PSDB, há a possibilidade de que tanto Dilma (ou outro candidato qualquer do PT) quanto Serra desejem continuar no cargo se estiverem indo bem no governo.Por mais que Dilma não tenha luz política própria antecedente, mesmo a sombra de Lula não será forte o suficiente para tirar do cargo um presidente eleito com popularidade.

O chefe do Gabinete Civil do governo Geisel, o general Golbery do Couto e Silva, um estrategista político dos mais competentes e sagazes, dizia que qualquer um que, eleito presidente, suba a rampa do Palácio do Planalto com aqueles soldados batendo continência chegará ao seu topo convencido de que chegou ali por seus próprios méritos, e não faltarão assessores e amigos para convencê-lo (a) disso.

Golbery falava por experiência própria, pois articulou com Geisel a indicação do general João Baptista Figueiredo para a Presidência, e acabou suplantado no Palácio do Planalto pelo prestígio dos novos amigos do presidente.

A tentativa de acabar com o instituto da reeleição, aumentando o mandato presidencial para cinco anos, volta e meia retorna à pauta política, e com ela as variações de praxe: prorrogação de um ano para os atuais detentores de mandato — presidente, governadores e prefeitos — ou a tese de que, com a mudança, nova era política começa, o que permitiria aos atuais detentores de mandatos executivos concorrerem dentro das novas regras.

Essa sempre foi uma preocupação da direção do PSDB, que vê na mudança de regras uma brecha legal para os que tentam viabilizar uma terceira candidatura seguida de Lula à Presidência da República.

Ambas as teses não contam com o respaldo da sociedade, e o mais sensato a fazer parece ser testar mais uma vez a reeleição, dando tempo a que esse instrumento político se consolide no país.

Tudo indica que não será através de artifícios que os tucanos vão consolidar uma necessária união partidária. Todos esses movimentos têm partido do próprio governador José Serra, para demonstrar a Aécio que faz as concessões necessárias para que o governador de Minas sintase confortável no partido.

A solução preferida do expresidente Fernando Henrique Cardoso é a chapa pura tucana, com Aécio de vice de Serra. Tanto o DEM como o PPS, partidos aliados do PSDB em nível nacional, concordam com essa composição, se ela servir para apaziguar as posições dentro do PSDB.

Mas essa não parece ser a melhor opção do governador de Minas, que tem o Senado como seu plano B, caso não consiga reverter o favoritismo de Serra dentro do PSDB, o que vai tentar nesses périplos pelo país.

No Senado, Aécio Neves não perderia sua identidade política e teria influência no próprio governo, quem sabe até como presidente da Casa, se os tucanos forem os vitoriosos, muito mais do que no cargo de vice-presidente, que não tem papel definido.

Além do mais, uma chapa pura tucana tem o inconveniente de, em caso de derrota, tirar da cena política as duas maiores lideranças do PSDB.