É exemplar da maneira de fazer política de Lula a decisão de não ir ao Fórum Econômico Mundial, que começa amanhã aqui, e comparecer ao Fórum Social Mundial em Belém. Com a crise internacional recrudescendo, Lula pela primeira vez comparece ao Fórum Social isoladamente, pronto para fazer críticas aos "donos do Universo" que a provocaram. Em 2007, com a economia mundial de vento em popa, e a brasileira entrando em ritmo de crescimento acima da média dos últimos anos, Lula escandalizou a esquerda ao decidir comparecer apenas ao Fórum Econômico, deixando de lado a reunião da esquerda mundial no Quênia.
Naquela ocasião, o ex-assessor especial da Presidência e um dos idealizadores do Fórum Social, Oded Grajew, lembrou que a coincidência de datas entre os dois eventos, desde a criação do evento, em 2001, foi proposital para "fazer as pessoas escolherem seus caminhos, dizerem onde se sentem mais identificadas".
É o que Lula está dizendo com a decisão de agora, que neste momento sente-se mais à vontade entre os seus socialistas do que entre os também seus capitalistas de Davos.
Em 2003, assim que assumiu a Presidência, decidiu comparecer aos dois Fóruns, foi vaiado em Porto Alegre por isso e tratado como a grande estrela da reunião daquele ano em Davos.
A parte dos integrantes do Fórum Social Mundial que vaiou Lula ficou em polvorosa com sua declaração de que a reunião corria o risco de se transformar em uma "feira de produtos ideológicos, onde cada um compra o que quiser e vende o que quiser".
Lula cobrava dos organizadores do Fórum foco em poucos temas, para que a reunião tivesse resultados concretos.
Tanto pragmatismo fez com Delfim Netto o comparasse ao líder chinês Deng Xiaoping, que iniciou a arrancada da China comunista para a economia de mercado, para quem não interessava a cor do gato, desde que comesse os ratos.
Em 2005, o presidente novamente participou dos dois encontros, foi a Porto Alegre, que sediava o social, e à Suíça.
Em 2004 (na Índia) e 2006 (na Venezuela e em Mali e no Paquistão), Lula não foi ao Fórum Social, mas também não foi ao Econômico. Em 2008, não houve Fórum Social, e Lula também não foi a Davos.
Os presidentes da Venezuela, Hugo Chávez, da Bolívia, Evo Morales, do Equador, Rafael Correa, e do Paraguai, Fernando Lugo, estarão também no Fórum Social Mundial, em Belém, e participarão, junto com Lula, de um debate promovido por movimentos sociais no dia 29. No dia 30, o presidente se reúne com o comitê internacional do Fórum.
Além do presidente, nada menos que 12 ministros confirmaram participação em atividades do Fórum, entre eles a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, no que está sendo considerada sua apresentação oficial à esquerda mundial como a candidata de Lula à sua sucessão.
O ministro da Justiça, Tarso Genro, receberá uma solidariedade internacional pela decisão de não extraditar o ex-terrorista italiano Cesare Battisti, que estava foragido há 26 anos e foi um dos chefes da organização de extrema-esquerda PAC (Proletários Armados pelo Comunismo), condenado à prisão perpétua na Itália por quatro assassinatos.
Esse caso merece um comentário paralelo. Por mais controverso que possa ter sido seu julgamento, por mais dúvidas que possam existir sobre sua participação em todas as mortes de que é acusado, a decisão do ministro brasileiro peca pela origem: como pode o mesmo ministro que entregou para uma das mais cruéis ditaduras do mundo os boxeadores cubanos Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara, que fugiram da concentração durante os jogos do Pan no Rio, alegar que Battisti corre o risco de ser perseguido na democrática Itália?
Tarso Genro, ou o governo brasileiro, não consideram a ditadura cubana de esquerda uma ameaça aos direitos humanos de foragidos, que não eram acusados de nada a não ser querer liberdade, mas acham que a democracia italiana, com um governo de direita no poder no momento, o é para um terrorista condenado por assassinatos ?
Uma atitude ignóbil, tão marcada de ideologia que não merece uma discussão sobre soberania brasileira. Ao contrário, o governo está usando a soberania do país para suas conveniências políticas.
Onze meses após, desmentindo o governo brasileiro que disse que os cubanos pediram para voltar ao seu país, Erislandy Lara, campeão mundial amador da categoria até 69 quilos, chegou a Hamburgo, na Alemanha, depois de ter fugido em uma lancha de Cuba para o México.
Os boxeadores haviam sido chamados de "traidores" por Fidel em um artigo do jornal oficial "Granma", nunca mais treinaram com a equipe de boxe do país e não foram convocados para disputar os Jogos Olímpicos em Pequim. Eram campeões mortos-vivos em seu país.
Comparar o caso à negativa de extradição pela Itália de Salvatore Cacciola parece até piada do ministro Luiz Dulci. Só se Cesare Battisti tem nacionalidade brasileira e ninguém sabe, ou é pai de uma criança brasileira, coisa que o grande público desconhece.
O fato é que, na busca de reaproximação com os movimentos sociais, Lula prepara discurso com críticas aos Estados Unidos e aos países desenvolvidos, culpando-os pela crise econômica mundial. Os companheiros de mesa que ouvirão suas críticas foram os mesmos que, meses atrás, ouviram um sábio conselho de Lula, que ele mesmo não está seguindo: chega de culpar os outros por nossos problemas, disse num desses inúmeros encontros regionais de que participa.
Mas, desde que a crise internacional se mostrou mais do que uma simples "marolinha", ele e seus parceiros, que perderam a força dos argumentos com a queda generalizada do preço do petróleo e do gás, só fazem falar mal dos países desenvolvidos, e a reunião de Belém será certamente mais uma oportunidade, como foram as cúpulas de Salvador, na Costa do Sauípe, recentemente. |
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