quarta-feira, dezembro 24, 2008

Dora Kramer A prova do retrovisor


Nesta mesma época, um ano atrás, o Senado acabara de derrubar a renovação da CPMF e, junto com ela, o governo anunciava também o fim do mundo. O presidente Luiz Inácio da Silva acusava a oposição de inviabilizar sua administração com a retirada dos R$ 40 bilhões de arrecadação anual do imposto do cheque.

O cenário para 2008, no entanto, era de abundância absoluta: situação internacional confortável, inflação controlada, crescimento das despesas públicas preocupante, mas, no geral, tudo estava muito bem arrumado para um período de gastança e exuberância eleitoral no pleito municipal, que funcionaria como uma espécie de plebiscito em favor do projeto de sucessão do presidente Lula.

Um ano depois, verifica-se o equívoco das previsões. Aquele que parecia o assunto mais fundamental do planeta, a queda da CPMF, saiu da agenda e sequer é levado em conta em qualquer análise de conjuntura.

A gastança pública prosperou, mas não teve relação direta com o resultado da eleição nem confirmou a expectativa de que o quadro seria favorável em qualquer hipótese. De pé, e mais forte do que nunca, só ficou mesmo a popularidade do presidente da República.

A crise internacional chegou no segundo semestre, ainda não mostrou se seus dentes são mesmo afiados, mas deu uma meia-trava no horizonte de país das maravilhas. Nesse meio tempo as urnas municipais levaram ao Palácio do Planalto a notícia de que a popularidade e o poder de fogo do presidente Lula não são suficientes para ganhar uma eleição.

Houve abalos de autoconfiança no governo e na oposição, o que obrigou uma revisão de planos. Constatação óbvia: a conjuntura é fluida, as previsões são irresistíveis, mas frágeis ante a força dos fatos. Quer dizer, implicam necessariamente uma enorme margem de erro.

Donde a total impossibilidade de se satisfazer, desde já, a curiosidade nacional a respeito do que acontecerá em 2010. Mais não fosse, porque ainda falta acontecer 2009.

Segundo as pesquisas, os governadores José Serra e Aécio Neves ganham a eleição presidencial de qualquer candidato que não seja Lula. Isso significa que o PSDB está com os dois pés dentro do Palácio do Planalto?

Nem com os dois, nem com um, mas pode ficar no ora veja depositado nos quatro se repetir as bobagens de 2002, 2006 e 2008, aqui com bom resultado final, mas uma preliminar desastrosa.

Um dado novo da agenda de 2009 pode mudar tudo também: o início da tramitação da emenda que acaba com a reeleição e institui cinco anos de mandato para presidentes, governadores e prefeitos.

O governo faz de conta que não patrocina a proposta e apresenta como álibi uma sugestão de reforma política, cujo único ponto de consenso é a abertura de uma “janela” para o troca-troca de partidos.

O essencial é que o fim da reeleição ensejará a volta do debate sobre o terceiro mandato, ou até a prorrogação de um ano, para Lula. Uma proposta quase impossível de passar, mesmo com a popularidade do presidente nos píncaros.

Por muito menos o governo perdeu batalhas nas urnas e no Congresso. Portanto, as obras estão em aberto à disposição das querências dos personagens envolvidos, mas na dependência das “poderências” determinadas pelas circunstâncias.

De sólido em matéria de previsões, o ativismo do Judiciário foi a exceção confirmadora da regra.

Flor do recesso

Governos quando não sabem direito como lidar com um assunto de forma objetiva, mas precisam dar a impressão de providências, criam um grupo de trabalho ou fazem uma reunião.

É nesse quadro que se insere a idéia do Palácio do Planalto de convocar os governadores para um grande encontro em janeiro para de discutir medidas conjuntas de combate à crise.

A chance de entendimento entre governadores e presidente na distribuição de perdas e ganhos é a mesma do acordo em torno da reforma tributária, tal a diversidade de interesses em jogo.

A menos que, nesse caso, o presidente Luiz Inácio da Silva esteja disposto a desagradar, no papel de árbitro.

Poder dos partidos

O deputado Miro Teixeira apresentou uma série de consultas ao Tribunal Superior Eleitoral – a serem examinadas após o recesso –, cuja origem é a declaração de posse dos mandatos eletivos pelos partidos, não pelos candidatos, e o objetivo (grosso modo) é tentar desmontar a premissa de que os partidos podem tudo.

O assunto merece detalhamento mais bem explicado, mas por ora Miro resume o espírito da coisa na seguinte frase: “No Brasil nós fingimos ter uma democracia organizada por partidos, mas os partidos não se regem por práticas democráticas”.

Até 2009

Que a virada do ano consiga virar suas excelências de frente para a sociedade.