Brasil e real são passageiros involuntários do trem louco, desgovernado e descarrilado das moedas pelo mundo |
A BOVESPA caiu menos neste ano que as Bolsas de Rússia, China, Índia e de Hong Kong.
Sangra quase tanto como a de Alemanha, Japão, Coréia e Cingapura.
E daí? Embora a relevância da Bovespa para a economia e para a poupança brasileiras tenha crescido muito após 2003, no Brasil, como na China, por exemplo, os tombos das ações ainda não têm o impacto de um derretimento em Nova York ou em Tóquio. Além do mais, nenhum índice de ações reflete pontual e necessariamente as perspectivas sobre o estado da economia e das empresas -o Ibovespa ainda menos.
Mas a Bolsa de São Paulo tem sido um termômetro das pressões contra o real, que, apesar de enormes, poderiam ser ainda mais graves caso o Banco Central não escorasse a moeda brasileira. Agora é também um indicador indireto, se impreciso, das perspectivas sombrias de financiamento para a economia brasileira nos próximos meses. O Brasil não tem problemas sérios em suas contas externas (grosso modo, o balanço de entradas e saídas de dólares). Mas a loucura do mercado de câmbio mundial nos traga. Na semana passada, adentrando por esta, explodiu de vez uma crise no mercado mundial de moedas.
Mais uma crise, a se somar à bancária e à de crédito, e dela derivada.
Países do Leste Europeu vão à breca, devido aos seus déficits externos, e fazem fila no FMI (Hungria, Ucrânia, Sérvia, depois talvez Croácia, Romênia, Polônia). Portugal e Grécia, por exemplo, não foram à lona apenas (e por enquanto) porque adotaram o euro. Algum país do Oriente Médio e algum asiático também estão na linha de tiro.
A fuga do risco, devido a medo ou a prejuízos, tira dinheiro e exaure as reservas desses países que dependem demais de financiamento externo, o que se evidencia na desvalorização de suas moedas. Mas também Coréia e Austrália sofrem desvalorizações fortes. Nem libra e euro escapam, embora as conseqüências aí não sejam tão dramáticas. O outro lado do mergulho dessas moedas são os saltos do dólar e do iene.
A alta do iene é tão espetacular que o Japão pediu ao G7 que soltasse um comunicado calmante, no qual se insinuava uma intervenção internacional no câmbio. O Japão, aliás, prepara um pacotão com os mesmos ingredientes dos euroamericanos.
Um iene forte demais tende a reduzir as exportações japonesas, das quais o crescimento do país depende muito, além de provocar outras desorganizações dramáticas nas economias do resto do planeta.
Não se deu muita bola ao comunicado do G7. Levou só um pouco mais de atenção a insinuação de corte de juros na Europa e EUA. A julgar pelas bateladas de análises, nada disso vai no curto prazo aliviar a paralisia de crédito e a liquidação de ativos de risco. Tal liquidação vai continuar a sangrar ou quebrar países "emergentes" e a valorizar o dólar e o iene.
A sangria pode ter reflexos em banco europeus, muitíssimo mais expostos aos emergentes que os bancos dos EUA, diz o Morgan Stannley. O impacto adicional nos bancos no mínimo não vai aliviar em nada a seca de crédito, a fuga do risco, a destruição financeira e a desorganização do comércio mundial.
O Brasil e o real são passageiros involuntários desse trem desgovernado.