Vereadores trabalham muito ou pouco? Depende. Uma cidade como o Rio tem cerca de quatro mil leis. Precisa de mais? Em 2005, início da atual legislatura, que agora se encerra, tramitavam pela Câmara cerca de 3.100 projetos dos vereadores. Em um ano a cidade correu o risco de duplicar o número de leis. Talvez por terem trabalhado pouco, para quem avalia o desempenho de uma Câmara com a ótica quantitativa, vereadores mandaram para a sanção do prefeito “apenas” 367 leis. Uma por dia! Será pouco? Sancionadas ou promulgadas pela Câmara, as leis foram ou são ignoradas pelo Executivo e/ou desconhecidas da população. Como tantas outras de nossa babel legislativa.
Nos anos seguintes, os vereadores apresentaram menos projetos. Cerca de 200 por ano, fazendo com que o Diário da Câmara, antes robusto e pesado, passasse a circular bem mais leve. Uma queda enorme na produtividade dos vereadores! Foi ruim? Não, foi ótimo.
Que leis os vereadores faziam e deixaram de fazer? Eram as chamadas autorizativas.
Algo assim: autorizo o prefeito a fazer uma escola na comunidade tal, a asfaltar a rua tal, a abrir os postos de saúde nos fins de semana, a tratar os diabéticos dessa ou de outra forma e por aí vai. A maioria dessas leis atendia à necessidade ou era de interesse da população. Eram projetos meritórios, portanto. Fariam diferença na vida das pessoas. No entanto, atropelavam a prerrogativa do prefeito de decidir como organizar a prefeitura e criavam despesas fora do Orçamento. Eram portanto ilegais, inconstitucionais e inócuas. Nos últimos 15 anos os projetos autorizativos viraram uma praga na Câmara Municipal, entre outras razões, porque o Executivo, enquanto vetava e argüia a inconstitucionalidade de uma lei, sancionava lei idêntica quando queria agradar a um vereador. A partir de meados de 2006, proibiu-se a tramitação de novos projetos autorizativos. A redução na produtividade significou um ganho enorme na qualidade legislativa, menos desperdício de recursos, alívio para o Judiciário com a redução das ações de inconstitucionalidade, mais transparência na relação entre o eleitor e o cidadão. Valorizou-se a atividade legislativa. Mas a lei mais estratégica para a cidade, o Plano Diretor, não foi aprovada. Ou seja, trabalhou-se “menos”, o que foi bom, mas trabalhouse mal, o que é ruim.
Afinal, para que serve o vereador? Essa, sim, é a pergunta que precisa de um entendimento amplo, para que o cidadão possa cobrar, analisar e decidir se valeu a pena sua escolha, acompanhando a atuação do vereador na sua totalidade. Ao vereador cabe legislar, fiscalizar o Executivo e mediar conflitos entre a sociedade e o poder público.
Mas o vereador não tem a iniciativa de propor leis que interfiram na administração pública. E essa é, em geral, a expectativa maior do eleitor. Daí a frustração, a sensação de que “o vereador não fez nada”. Em compensação o prefeito, para governar, precisa pedir à Câmara aprovação para quase tudo. A mais importante das leis encaminhadas é a orçamentária.
Além de discutir o orçamento, emendá-lo, entender onde, para quem, e como serão usados os recursos dos cidadãos, o vereador tem a obrigação de fiscalizar o cumprimento do orçamento que aprovou, fazer audiências com os secretários, garantir a participação popular na proposta orçamentária.
Ao vereador é concedido o direito de propor leis sobre temas como ocupação do solo urbano e normas gerais de funcionamento da cidade, o que já lhe dá um poder e responsabilidade enormes; pode requerer todo tipo de informação sobre a prefeitura, instalar Comissões de Inquérito para apurar suspeitas de irregularidades, criar comissões temáticas, denunciar ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas, debater e propor medidas que o prefeito aceita ou não.
Mas o vereador não substitui o Executivo, nem faz aquilo que é dever e competência da prefeitura. Já existem movimentos da sociedade dispostos a olhar com lupa seu trabalho. Isso é muito bom. Com razão a sociedade está insatisfeita, com a predominância dada à concessão de medalhas, nomes de rua e com o noticiário sobre os fichassujas.
Adote um vereador. E essa adoção é necessária porque, dos 4,5 milhões de eleitores, apenas pouco mais de um milhão elegeu alguém entre os 1,3 mil candidatos. Dois milhões de eleitores não votaram, votaram na legenda do partido, ou optaram pelo voto em branco ou nulo. Por medo de errar, por desencanto ou porque não se sabe bem para que serve um vereador.