Em pouco tempo, a economia dos EUA pode emergir mais forte industrialmente e menos alavancada
O DEBATE mais interessante entre os analistas que acompanham a economia global está centrado em dois modelos antagônicos para explicá-la. O primeiro trabalha o conceito de que a economia mundial continua centrada nos ciclos dos Estados Unidos. A outra leitura -que me parece correta- incorpora as mudanças que vêm ocorrendo e reflete sobre um mundo em que os Estados Unidos não são mais o seu pólo HEGEMÔNICO.
A semente inicial dessa nova forma de ver o mundo foi a criação, pelo economista Jim O"Neill, do banco Goldman Sachs, da expressão Brics. Posteriormente, ele lançou a expressão "DECOUPLING" -descolamento- para aprofundar sua tese sobre a importância de um grupo de países emergentes. Essa nova expressão carregava o erro de sugerir que esse novo pólo econômico estaria descolado da dinâmica dos países desenvolvidos. Isso não é verdade, pois a relação de interdependência entre esses blocos existe e é muito forte, principalmente via canal financeiro. Portanto, apesar de interessante, o conceito se mostrou parcial para explicar a nova realidade.
Um trabalho mais recente sobre essa mesma questão é o do economista Jonathan Anderson, ligado também a outro grande banco internacional. Para ele, em vez da expressão descolamento, é a pergunta "who drives who?", ou seja, "quem puxa quem?", que deve ser colocada no debate. Para ele, os países emergentes estão atingindo uma dimensão quase que proporcional à do gigante americano, tirando deste o poder de sincronizar a economia global a partir de sua própria dinâmica. Segundo seus cálculos, o PIB dessa nova força motriz já é igual ao dos países desenvolvidos. Mas a grande diferença é que a taxa de crescimento do consumo e dos novos investimentos desse grupo é muito superior à americana.
Tenho escrito com freqüência sobre essa nova economia global que se desenha diante de nós e na qual o Brasil está inserido de forma sólida.
Uma vez aceita a idéia de que a importância da economia americana se reduziu muito -e vai continuar a se reduzir nos próximos anos-, surgem várias questões relevantes.
A primeira é a constatação de que o Fed não é mais totalmente autônomo a nível global. No momento atual, isso significa que a política monetária americana precisa considerar que o dinamismo do mundo emergente, ao manter a inflação mundial elevada, impõe um risco sério de alta de juros nos EUA, mesmo na presença de uma quase recessão. Essa é uma grande novidade (ainda não absorvida pelos analistas), uma verdadeira ruptura com o padrão de gestão monetária do Fed nos últimos 30 anos.
Outra questão é a possibilidade, agora, de um ajuste no comportamento do consumidor americano, com um aumento expressivo de sua taxa de poupança, processo que sempre esbarrou em uma questão muito simples: ajuste em cima de quem? Com o aparecimento de um mercado consumidor da dimensão do americano e com taxas de crescimento expressivas, é hoje possível ajustar o consumidor americano.
Essa é a segunda novidade. Estamos caminhando para um mundo mais balanceado, que, no devido tempo, estabilizará o valor do dólar. Em pouco tempo, talvez dois ou três anos, a economia dos EUA pode emergir mais forte industrialmente e menos alavancada, algo que também não parece estar na conta das pessoas.
Voltarei a este assunto...