O Estado de S. Paulo |
31/7/2008 |
O chanceler Celso Amorim caiu na real: "Agora vamos ter de nos concentrar em coisas que dão resultados", desabafou em Genebra, depois de reconhecido o fracasso das negociações da Rodada Doha. Ficou entendido que a diplomacia comercial brasileira se dedicara a coisas que não dão resultados. Nas exaustivas discussões no âmbito do Grupo dos Sete (G-7, os sete países mais ricos), as posições do Brasil já se haviam descolado das defendidas por outras potências emergentes, especialmente China e Índia. As tais alianças Sul-Sul se mostraram mais vazias e incompatíveis com os interesses do País do que o acerto prévio com os países ricos, cujos resultados, embora pífios, se vêem melhor. Como observou o embaixador José Botafogo Gonçalves, "a divisão entre ricos e pobres perdeu o sentido; não sei quem é pobre e quem é rico". Enfim, a diplomacia brasileira apostou em coisas que produziram espuma ideológica e muita retórica. E foi só; ou quase só. Amorim reconheceu que o caminho que sobra é o que foi rechaçado ou relegado a segundo plano pelo governo Lula: é o das negociações bilaterais ou regionais com a Ásia, União Européia e com quem for. O diagnóstico prevalecente no Itamaraty fora o de que as grandes divergências que apareceriam nas negociações bilaterais e regionais só poderiam ser ultrapassadas nas negociações multilaterais da Rodada Doha, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). Foi por isso que os projetos de acordo bilateral foram congelados ou abandonados. É verdade que o governo americano não mostrou nenhum especial entusiasmo para levar à frente o projeto da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Mas também é verdade que o governo Lula o torpedeou com todas as forças. Agora se vê que tempo precioso foi perdido. Estão em vigor ao redor do mundo ou em estágio final de negociação cerca de 300 acordos desse tipo, que ganham importância com o fiasco da Rodada e farão a diferença. O Brasil chega tarde para esse jogo. Este não é o único problema. Dadas as atuais amarrações estratégicas, o País só pode negociar como integrante do Mercosul, que, na condição de união aduaneira, exige unificação de políticas de comércio exterior. E, no entanto, a Argentina vai dando seguidas demonstrações de que tem interesses nacionais divergentes do Brasil e está mais disposta a emperrar do que a agilizar processos. Isso remete a uma condição nunca corajosamente enfrentada: a de que, para obter os resultados reclamados por Amorim, será preciso rebaixar o Mercosul à condição de área de livre-comércio para que cada um dos seus membros possa negociar em separado. O projeto da união aduaneira ficaria para quando afinal se obtivesse a convergência dos fundamentos macroeconômicos dos países membros e a unificação de políticas. O governo Lula chega a seu fim sem resultados a apresentar nas negociações comerciais. Mas o quadro geral é outro. Há sete anos, quando foi lançada a Rodada, havia abundância de grãos, manteiga e carne financiada por subsídios que destruíram o sistema produtivo dos países pobres. Agora, os protecionismos e os subsídios desleais estão sendo atropelados pela escassez. CONFIRA Pancada - Em julho, até o dia 28, os preços do petróleo haviam caído 11% em Nova York. Bastou que as estatísticas mostrassem forte queda nos estoques de gasolina americanos para que as cotações reagissem. Ontem subiram quase 4%. É o verão - Foi como se o mercado voltasse a dar-se conta de que é verão no Hemisfério Norte, temporada de aumento do consumo do combustível. Barriga - As curvas de preços haviam produzido uma barriga correspondente ao ajuste dos mercados. Mas o diagnóstico geral de aumento do consumo de energia, especialmente pelos asiáticos, não foi revertido |