ROMA - Além de todas as suas belezas e graças conhecidas, a Itália moderna tem um outro lado, não tão belo, de regionalismo exacerbado, que teve uma de suas mais completas traduções numa histórica pesquisa realizada pela rádio Radicale nos anos 80.
Para tentar saber o que realmente pensavam os italianos, durante um mês, a rádio abriu seus telefones e secretárias eletrônicas para qualquer um dizer, em 30 segundos, o que quisesse, livre e anonimamente, apenas informando de onde falava. Sem nenhuma censura ou edição, tudo foi ao ar.
Foi a maior coleção de insultos, ofensas, blasfêmias e vitupérios que a Itália já ouviu. Um assustador, e hilariante, festival de ódio. Napolitanos esculachando milaneses, romanos arrasando sicilianos, turineses caindo de pau em venezianos, todos detonando os florentinos, e assim por diante, nos mais diversos sotaques.
E não só por rivalidades futebolísticas. Unificada, à força, há apenas 152 anos, a Itália reuniu o Reino de Nápoles e da Sicília ao do Piemonte e da Sardenha, a República de Veneza à Toscana e à Lombardia, cada qual com sua cultura e sua língua, acostumados a guerrear entre si por séculos e gerações.
E a luta continua. Romanos dizem que Nápoles não é sul da Itália, mas norte da África. Em Florença falam que é melhor ter um morto em casa do que um milanês batendo à porta.
Só a Azzurra, a seleção de futebol, é capaz de unir tribos tão diversas e antagônicas. Na ressaca da chinelada que levaram da Espanha na Eurocopa, os italianos estão devastados. Pior seria se os turcos fossem campeões: "A Turquia é Oriente Médio, não faz parte da Europa. Por que não convidaram também Uganda?", rosnam os berlusconianos mais radicais, ameaçando um boicote ao kebab.