sexta-feira, junho 27, 2008

Luiz Garcia - A bancada da ficha suja




O Globo
27/6/2008

Não é sarcasmo: até o presidente Lula - ignorando, pode até ser de propósito, a quantidade de aliados seus nessa situação - soltou o verbo contra a decisão do Tribunal Superior Eleitoral a favor do registro de candidatos com condenações ainda não inapeláveis por crimes diversos.

Infelizmente, Lula é tão vago quanto enfático. Além de confuso: fala em resolver o problema no contexto da reforma política. É equívoco sério, porque o problema pede mexida em outra área; específica e unicamente na legislação eleitoral. A reforma política, venerável obra de Santa Engrácia, trata de outros assuntos.

Na maioria dos casos, os candidatos-réus respondem por formas variadas de desonestidade. Mas há também políticos processados, digamos assim, por tentativas bem ou malsucedidas de libertar adversários políticos do fardo da existência terrena.

Não tem nada de romântica a atitude dos juízes eleitorais, decidindo continuar negando registro a candidatos já condenados por qualquer crime em primeira ou mesmo segunda instância. Para que tenha conseqüências práticas bastará que o eleitor exerça sabiamente o seu dever cívico, negando seu voto à bancada da ficha suja.

Não é realista esperar com ajuda dos partidos numa depuração nas listas de candidatos: todos têm, pelo Brasil afora, filiados buscando o habeas corpus da vitória eleitoral. Mas não faltam instituições apartidárias, interessadas apenas no bem público. Podem preparar listas de já condenados e divulgá-las para o eleitor municipal. A mídia tem seu papel nessa divulgação. Não estará fazendo denúncia política: simplesmente, fornecendo informação cívica, seca mas eloqüente; obviamente, sem qualquer exceção.

Outro caminho para atenuar os efeitos da decisão do TSE seria uma alteração na Lei Orgânica dos Partidos, exigindo que registrassem na propaganda gratuita qualquer condenação de candidatos seus em processos criminais.

Mas falemos sério: é sonho de uma noite de inverno imaginar que o Congresso, com sua quantidade de processados e processáveis, teria hoje interesse e ânimo para tocar para diante qualquer mudança contrária aos interesses de muitos de seus membros.

Para as eleições municipais deste ano, só a consciência dos próprios eleitores pode fazer diferença. Em teoria, é muito simples: basta que votem segundo seus próprios interesses como cidadãos. Na prática, todo mundo sabe que o índice de desatenção e desinteresse ainda é muito alto. Tanto no grotão como na metrópole.

O Brasil já teve primeiras-damas de variados perfis. Dedicadas administradoras de programas assistenciais, como Darcy Vargas. Silenciosas donas de casa, como Santinha Dutra. E umas duas ou três da pá virada.

Ruth Cardoso tinha perfil muito próprio, muito especial. Foi discreta como algumas, operosas como poucas. E levou para a posição uma bagagem intelectual absolutamente inédita. Depois dos dois mandatos do presidente Fernando Henrique, a missão de d. Ruth estava cumprida. Seu exemplo continuava e continua valendo.