Mortes quase sempre geram muita tristeza, tréguas e pausas para pensar, mesmo nas mais conflagradas famílias. Foi o que a morte de Ruth Cardoso produziu, deixando como marca uma foto emocionante sob o ponto de vista humano e emblemática sob o político: a do abraço, em lágrimas, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e de seu sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva. Um abraço de velhos companheiros, não de atuais adversários, e que não vai mudar a política em nada (principalmente diante das eleições municipais), mas mexeu com corações endurecidos e partidarismos inflexíveis no PT e no PSDB. Aliados nos tempos do inimigo comum, a ditadura militar, FHC, Lula e seus respectivos grupos e partidos se distanciaram basicamente por diferenças de táticas políticas e de estratégia, aprofundadas ao longo do tempo pela disputa de poder. De aliados passaram a adversários e chegaram a inimigos, capazes de se ferirem cruelmente. FHC e Lula são o que há de melhor na política brasileira, pela capacidade intelectual de um, a perspicácia do outro, a liderança e a excepcionalidade de ambos. FHC fincou as bases em praticamente todas as áreas para um país muito melhor do que encontrara oito anos antes. Lula pegou o bonde e acelerou. Os avanços na economia e na gestão, porém, não refletiram em melhorias na prática política nem no refluxo nos escândalos. Os dois, entrincheirados em seus partidos e reféns de suas alianças, conviveram com erros bem parecidos. Mas é justamente por esses erros que se matam uns aos outros. O sujo falando do mal lavado. A diferença é que Lula e os petistas foram implacáveis contra FHC e os tucanos no poder, mas não suportam provar do próprio veneno. Virou uma guerra. E, se o Brasil bateu no seu teto político com FHC e Lula, o que virá depois? A foto do abraço, tão forte, contundente, remete ao passado, mas não projeta o futuro. |