O Estado de S. Paulo |
28/5/2008 |
O intervalo de duas semanas entre a saída de Marina Silva e a entrada de Carlos Minc no Ministério do Meio Ambiente foi providencial: deu tempo para o presidente Luiz Inácio da Silva reescrever o episódio à sua moda e, assim, apresentá-lo ontem na solenidade de posse, no Palácio do Planalto. Na prudente distância das homenagens a Marina e das críticas ao tratamento dado a ela pelo governo, Lula pôde inverter a ordem de todos os fatores e oferecer “à companheira” a proteção magnânima reservada aos ofendidos. Marina Silva só não foi tão elogiada quanto alguns outros que não saíram por vontade própria, mas por ação de algum escândalo. Ainda assim, ouviu palavras de consolo por não ter merecido, “enquanto esteve no ministério”, as referências positivas feitas na imprensa quando da repercussão de sua saída. “Quero confessar: durante cinco anos vi poucas colunas falando bem da Marina”, disse Lula, ressaltando o quanto a então ministra “apanhou” da imprensa que, por essa versão, quando não a difamava, se omitia. “Quantas vezes ela me dizia que tinha dado entrevista, mas não saía nada nos jornais”, relatou - sempre com a imagem de uma Marina serena e sisuda, sentada bem atrás dele -, sem esquecer de atribuir também a insatisfação final de Marina ao parco noticiário a respeito do lançamento do Programa Amazônia Sustentável. Nem uma só palavra sobre a decisão dele, Lula, de entregar a coordenação do PAS ao professor Mangabeira Unger, coincidentemente ontem mesmo um confesso “ignorante” em matéria de Amazônia. Todas as reclamações internas contra o radicalismo ambiental de Marina e sua equipe, responsabilizados abertamente pela paralisação de projetos de infra-estrutura, na solenidade transformaram-se em intrigas mediante as quais a imprensa, e não o governo quase todo, procurava desgastá-la. Nem uma só referência, mesmo indireta, à série de embates, por vezes desmoralizantes, que terminaram por fazer Marina Silva no dia 13 de maio entregar o “pescoço” para preservar “o juízo”, como avisara dois anos antes. Nos revides e distorções, o presidente deixou-se trair sobre o que realmente o incomodou na saída da ministra: o noticiário favorável a ela e desfavorável ao governo dele. Lula falou disso o tempo todo, com o sinal trocado. Quis fazer graça com Marina e Dilma Rousseff e, pretendendo desmentir divergências, confirmou. Apontou para as duas, sentadas lado a lado na cerimônia, que continuaram impassíveis. Dilma ainda ensaiou um sorriso, morto, porém, ao nascer. E assim Lula foi tentando vencer a silenciosa supremacia de Marina aos trancos, até a metáfora futebolística final, completamente fora do lugar. Ao compará-la a Pelé, o presidente escolheu dois exemplos em que a substituição do craque se revelou um acerto do destino. Se a idéia era enaltecedora, o resultado foi depreciativo. E revelador no quesito despeito do autor. Brios seletivos Uma senadora no exercício da presidência de uma comissão parlamentar de inquérito chama a principal ministra do governo de mentirosa e a ministra, com desdém, mal responde. A despeito do inusitado da cena, não é o desapreço de Dilma Rousseff pelo Congresso o que chama atenção. Espanta é o repentino desapreço da ministra para com a credibilidade da própria palavra. Instada a dizer a verdade na Comissão de Infra-Estrutura do Senado, por uma muitíssimo infeliz comparação do senador Agripino Maia à conduta dela quando militante de esquerda, Dilma resguardou de imediato o seu passado com uma longa reprimenda ao incontinente. Acusada pela senadora Marisa Serrano de mentir aos senadores em plena democracia, a ministra não exibiu a mesma altiva indignação. “Não respondo a isso”, esquivou-se, sucinta. Quando José Aparecido Nunes Pires a desmentiu, confirmando no Senado a existência do dossiê, a ministra Dilma tampouco se manifestou em defesa de sua palavra. Calando, não apenas consentiu: mostrou que sua exaltação às virtudes da mentira não se prende a épocas; antes, diz respeito ao modo de ser fiel às causas. Melhor dizendo O PT não “vetou” a aliança entre o governador Aécio Neves e o prefeito Fernando Pimentel, em Minas Gerais. Na segunda-feira, a Executiva petista formalizou o gestual para acomodar as correntes internas mineiras de forma a não fechar desde já o jogo da sucessão estadual de 2010. Até porque nada garante que daqui a dois anos vá de fato interessar ao PSDB abrir mão do segundo maior colégio eleitoral do País em honra ao compromisso do apoio de Aécio à candidatura de Pimentel. A aliança para a eleição da Prefeitura de Belo Horizonte prosseguirá entre o PT e o PSB, sem a presença formal do PSDB. Como não há oponente competitivo, o tempo de televisão não faz a menor diferença. |