Alguém aí se surpreendeu com o circo em que se transformou a CPI dos Cartões Corporativos? Ou todos sabem que é parte do show da política, cada vez com menos exceções? Nem se tocou no que é o verdadeiro fundo da questão, a saber: a facilidade com que o mundo político confunde seu próprio bolso com o erário. Simples assim. Para piorar as coisas, quem deveria ser o maior fiscal do bom uso do dinheiro público, Jorge Hage, corregedor-geral da República, já antecipou um habeas corpus para qualquer abuso com a sua afirmação de que o caso da tapioca comprada pelo ministro de Esportes era a "escandalização do nada". Posto de outra forma: Hage introduz o conceito de corrupção por quilo. Uma tapioca realmente pesa pouco, mas o ponto não é esse. O ponto é que qualquer desvio de fundos públicos, pequeno, médio ou grande, é um escândalo, seja para comprar tapioca, seja para cobrar e não construir uma ponte. Se fosse possível levar a sério a teoria de Hage, a providência seguinte imediata seria divulgar uma tabelinha que dissesse o que o corregedor entende que merece escândalo. Duas tapiocas valem um escândalo? Ou seria preciso uma dúzia? Ou uma centena? Em países mais ou menos normais, o corregedor-geral da República ficaria uma fera mesmo que sumisse um humilde lápis de qualquer repartição pública. Aqui, um ministro equivocar-se e comprar com dinheiro público alguma coisa, seja o que for, é "nada". Posso até admitir que o ministro tenha se enganado -e todo mundo está sujeito a enganos- e devolveu o dinheiro. Ainda assim, entender que é "nada" um abuso, qualquer que seja o valor, é introduzir um habeas corpus preventivo para qualquer outro abuso, porque corrupção não se mede a quilo, mas, sim, por existir ou não. |