Tião Rocha, educador popular no vale do Jequitinhonha e empreendedor social do ano passado, manda uma cartinha incrivelmente amável para me convidar para a inauguração do cinema "Meninos de Araçuaí", na cidade mineira do mesmo nome. Os "Meninos" surgiram há exatos dez anos, a partir do desejo da criançada e de educadores "de se inventarem um coro", no dizer de Tião, fanático por Guimarães Rosa, se fosse preciso explicitar. Nestes dez anos, os meninos e seu coro têm feito formação permanente, montaram cinco espetáculos de sucesso, apresentaram-se no Brasil e também na França, gravaram dois CDs e um DVD e já atuaram com artistas do calibre de Gilberto Gil e Milton Nascimento. Os meninos não apenas cantam. Com o espetáculo "Santa Ceia" (2003) conquistaram para Araçuaí toneladas de alimentos, que o Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento organizou em um "Empório Solidário", uma espécie de supermercado que alimentou 180 famílias, "com a maior dignidade", durante dois anos. Com o dinheiro ganho com "Santa Ceia" e com os CDs, a garotada montou uma espécie de orçamento participativo com suas comunidades, em torno de propostas culturais. Quarenta foram apresentadas. A campeã foi a construção de um cine-teatro. O dinheiro não deu para o teatro, mas deu para o cinema, graças a parcerias com a iniciativa privada e o setor público. É essa sala que se inaugura hoje, "o único cinema de verdade a funcionar no Jequitinhonha". Tião pede que eu indique um filme para ajudar a compor a programação do cinema. A minha indicação é a sua vida, Tião, o seu trabalho e o dos "Meninos", de todos os meninos que vocês educaram e estão educando. Pena que não passe em todos os cinemas do Brasil. |