O Estado de S. Paulo |
31/1/2008 |
Os especialistas ainda vão gastar horas e horas em debates e análises sobre se o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) está fazendo a coisa certa ao derrubar tão fortemente os juros para enfrentar uma crise e/ou para conter o nervosismo do mercado financeiro. Por certo, a principal função de um banco central é defender a moeda. E, no entanto, esses cortes dos juros, à velocidade em que estão acontecendo, levarão à acentuada desvalorização do dólar, o contrário do efeito que deveria produzir. Pode ser lembrado, ainda, que o Fed está sendo acusado de ter estimulado a produção de bolhas na economia americana porque manteve os juros baixos demais e empurrou os investidores para ativos de alto retorno imediato e para essa crise. E o que está fazendo agora não é outra coisa senão reduzir ainda mais os juros cujo principal potencial é produzir novas bolhas. Mas, neste momento, cabe aceitar os fatos e suas conseqüências. Como os juros são o preço do dinheiro, a opção do Fed foi despejar ainda mais dinheiro no sistema. A essa chuvarada ainda vão juntar-se as águas que o próprio Fed está canalizando para os bancos, as do pacote de incentivos que o presidente Bush e o Congresso dos Estados Unidos estão providenciando, mais as previamente existentes, que se conheciam genericamente como “situação de alta liquidez dos mercados”. Boa pergunta consiste em saber para onde correrá essa dinheirama que já não vai mais para o crédito hipotecário de alto risco, cuja bolha estourou. Em tempos de crise, os administradores de patrimônio em geral se refugiam nos títulos do Tesouro americano (treasures). Mas, com os juros em queda e com a desvalorização do dólar (ante o euro) à proporção de 12% ao ano, esse refúgio não é tão confiável. E, em larga medida, o mesmo pode-se dizer de todos os títulos amarrados ao dólar. Está certo dizer que há entupimento generalizado nos canais de crédito porque no escuro ninguém confia em ninguém, como diz, desde o século 1º antes de Cristo, um verso de Catulo: sublata lucerna nulla est fides. E isso equivale a afirmar que o dinheiro está parado, sem circular como deveria. Com base nisso, alguns especialistas prevêem que esses recursos permanecerão disponíveis, em conta corrente ou debaixo do colchão, à espera de que as condições melhorem. Esse empoçamento talvez seja inevitável, mas não por muito tempo. São recursos em dólares, moeda hoje em derretimento, como ficou dito. Isso parece sugerir que uma boa parcela do dinheiro paralisado pela crise, mais cedo ou mais tarde, acabará fluindo para os países emergentes, os refúgios da hora. Como entre os emergentes está o Brasil, encabeçando uma sigla famosa (Brics), parece inevitável não apenas o aumento do investimento de risco, mas, também, em ações de empresas brasileiras. Em outras palavras, apesar de toda a volatilidade e dos trancos que essa crise ainda provocará nos mercados globais, basta que o governo brasileiro não faça grandes besteiras para que o País acabe sendo beneficiado. CONFIRA Correção - Na edição de ontem, saiu um número errado. “Por volta de 2025, o consumo de alimentos da Índia deverá quadruplicar para US$ 1,5 trilhão” (e não para US$ 1,5 bilhão, como estava escrito). |