sexta-feira, dezembro 28, 2007

Juíza italiana manda prender brasileiros ligados à Operação Condor

Justiça que vem de fora


Diego Escosteguy

Carlos Namba
João Figueiredo
Ele envolveu-se na Operação Condor, segundo as autoridades italianas


O presidente Lula assumiu o governo com a promessa de quebrar um tabu e dar início à abertura ampla e irrestrita dos arquivos da ditadura militar. Cinco anos se foram, os documentos oficiais não apareceram e a história continua refém de um passado ainda não totalmente conhecido. Na última semana, num gesto embaraçoso para o Brasil, coube a outro país revelar mais um capítulo do que por aqui se tenta esconder. A Justiça da Itália determinou a prisão de treze brasileiros, entre militares e civis, acusados de envolvimento na morte de dois cidadãos italianos no começo da década de 80. Segundo as autoridades da Itália, há provas mais do que suficientes para demonstrar que a ditadura brasileira não só integrou a chamada Operação Condor – uma aliança entre as ditaduras da América do Sul montada para caçar e exterminar opositores desses regimes – como participou ativamente dela. O ex-presidente João Figueiredo, que morreu em 1999, encabeça a lista dos envolvidos. Além dele, há quatro generais que ocuparam postos importantes no governo militar, como o ex-ministro do Exército Walter Pires, o ex-chefe do SNI Octávio Medeiros e o ex-comandante do III Exército Antônio Bandeira – todos já falecidos. Completam a relação ex-agentes e policiais que integravam o aparato oficial da repressão – sete deles ainda vivos.

É a primeira vez que militares brasileiros são apontados pela Justiça como responsáveis por homicídios cometidos durante a Operação Condor. "Esse episódio é importante para que o Brasil aprenda que anistia não é amnésia", diz Cezar Britto, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil. "É constrangedor ver outra nação fazer o nosso dever de casa." Para os acusados ainda vivos, os pedidos de extradição devem restar como punição somente no plano simbólico. A Constituição garante que nenhum brasileiro pode ser extraditado por crimes cometidos no país. Os treze brasileiros integram uma lista de 140 ordens de prisão expedidas pela juíza Luisanna Figliolia, do tribunal penal de Roma, que nos últimos nove anos investiga a morte de 25 italianos, todos assassinados por governos militares latino-americanos. Os pedidos de prisão atingem, além de brasileiros, ex-autoridades argentinas, uruguaias, chilenas, bolivianas, peruanas e paraguaias. A ação da Justiça italiana não é um expediente inédito na Europa. Em 1998, o juiz espanhol Baltasar Garzón ganhou fama mundial ao determinar a prisão do ex-ditador Augusto Pinochet, apontado como o responsável por assassinatos de cidadãos espanhóis no período em que esteve à frente do governo chileno. Pinochet, que morreu em 2006, ficou 503 dias detido em Londres. Em 1990, a Justiça da França também condenou o militar argentino Alfredo Astiz, conhecido como "Anjo Louro da Morte", pela morte de duas freiras francesas em 1977.

A decisão da Justiça italiana veio no momento em que governos da América Latina começam a punir os algozes das ditaduras do século passado. Na Argentina, onde a "guerra suja" contra os insurgentes esquerdistas matou 30.000 pessoas, a Suprema Corte considerou que a lei de anistia aos militares era inconstitucional. Com isso, abriu-se o caminho para que se instaurassem novos inquéritos contra os criminosos de farda ainda vivos. No início de dezembro, seis militares foram condenados pelo seqüestro e morte de guerrilheiros de uma organização esquerdista. No Chile, há generais presos por envolvimento com o extermínio de oposicionistas. No Uruguai, também há uma onda de condenações: até o ex-presidente Juan María Bordaberry, um dos 140 acusados no processo italiano, está cumprindo pena. "Essas decisões são pedagógicas para o Brasil. Nós somos o único país que ainda se recusa a passar a limpo esse triste legado", diz o advogado Jair Krischke, presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, que colaborou com a investigação italiana. A Lei da Anistia foi um pacto sensato que ajudou militares e opositores a sair de um paralisante estado de beligerância. Não deve, porém, servir como justificativa para varrer para debaixo do tapete os crimes cometidos por ambos os lados.


Orlando Brito
Carlos Namba
Nani Gois
Euclydes Figueiredo
O general comandava o Exército no Rio de Janeiro
Octávio Medeiros
Chefiou por oito anos o SNI, o serviço secreto
Walter Pires
Foi o último ministro do Exército do regime militar


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Editorial Perfil
Augusto Pinochet
O chileno comandou uma ditadura implacável
Jorge Rafael Videla
Comandante da brutal repressão argentina