sábado, dezembro 22, 2007

DORA KRAMER Fora de órbita

Não foi preciso mais que algumas horas de operação do "plano de emergência", feito pelo Ministério da Defesa para "enfrentar" a crise aérea durante os feriados de fim de ano, para se concluir que o ir e vir dos passageiros de avião não é uma questão que o governo considere prioritária. Muito menos emergencial.

Os atrasos, as confusões, os desconfortos, o desrespeito, a quebra de contratos entre fornecedor e consumidor, o descaso continua o mesmo e já vai entrando em seu segundo ano sem que se vislumbre sequer um sinal de sensibilidade e atenção para com quem compra passagens, quer viajar e faz parte de um contingente de brasileiros que contribuiu com o crescimento de um setor já citado pelo ministro da Fazenda como exemplo eloqüente do crescimento da economia.

O lugar ocupado pelo problema na escala de prioridades do poder público federal, aliás, ficou bastante bem delineado no dia 29 de novembro último quando o encontro do presidente Luiz Inácio da Silva com o ministro Nelson Jobim para discutir o "plano" foi cancelado depois de uma hora de chá de cadeira, porque Lula precisava receber o grão-duque Henry de Luxemburgo.

Jobim caiu fora da agenda que naquele dia não estava exatamente frenética. Havia o almoço com o duque, uma reunião com um empresário, despachos internos e entrevistas à noite para a televisão.

O adiamento, inicialmente previsto para 20 dias, foi mais curto. Logo em seguida, Jobim pôde anunciar suas idéias de multar as empresas aéreas por atrasos e cancelamento de vôos e montar uma central de atendimento por intermédio da qual, garantiu-se, o consumidor enganado poderia receber seu dinheiro de volta.

O presidente, que há muitos meses pediu prazo para ver solucionado o caos aéreo, depois do desastre da TAM, em São Paulo, levou quatro dias para externar condolências às famílias dos mortos, trocou o ministro e assegurou que estava tudo resolvido, mais uma vez deixou as coisas por conta da sorte.

Sorte dele, que não precisa de avião de carreira, encontrou em Jobim em anteparo às críticas e não se importa com nada que não diga respeito ao risco de queda na popularidade das pesquisas. Como elas indicaram o efeito quase residual da crise aérea, azar de quem não representa peso significativo nos índices.

Anunciou-se o "plano" e ele não saiu do papel. A despeito de seis meses atrás, quando assumiu, o ministro Jobim ter feito da eficiência a sua profissão de fé - "faça ou saia", bradou ele na cerimônia de posse -, nesse meio tempo não conseguiu pensar em soluções para as questões surgidas em decorrência do "plano". Por exemplo: a quem e como punir quando a responsabilidade por atrasos ou cancelamento não for das companhias?

O tema continua em discussão, o fim de ano chegou, o passageiro segue à matroca e viu-se que o "plano" não passava de um cenário para servir de moldura a mais um lance de simulação de providências.

A encomenda

Despretensioso, jeito algo abilolado, eleito por exclusão à falta de nomes estrelados acima de qualquer suspeita no PMDB, o novo presidente do Senado, Garibaldi Alves, saiu-se melhor que a encomenda na entrevista em que fez ao mesmo tempo um balanço do ano legislativo e sua estréia oficial como porta-voz do Congresso.

Não tergiversou sobre a situação da combalida instituição, não cedeu à tentação demagógica de se apresentar como o paladino da restauração moral, não flexionou em excesso os joelhos a fim de apresentar credenciais ao Palácio do Planalto e, sobretudo, não enfeitou a realidade.

Foi ao ponto quando perguntado sobre aumento de salários de parlamentares, casca de banana clássica: "Aumento só se merece quando se está trabalhando bem. Vocês acham que o Senado está trabalhando bem? Eu acho que não." Simples assim. Respondeu olhando para o lado de fora sem descuidar do lado de dentro.

Pregou a urgência da mudança de conduta no Parlamento, mas avisou logo que não será o "justiceiro" do bom combate para não correr o risco de passar o pouco tempo de mandato (um ano) sem apoio do colegiado para presidi-lo.

Garibaldi falou a respeito das coisas como elas são. Não tentou dourar a pílula da proposta de entendimento feita à última hora para tentar salvar a CPMF - "Inês já estava morta" -, atribuiu aos derrotados o fracasso e reservou aos vitoriosos a glória, sem tentar uma troca artificial dos papéis como fizeram alguns - muitos, para fazer justiça - na tentativa de se mostrarem confiáveis ao Palácio do Planalto.

Na estréia, o sucessor do senhor da crise demonstrou independência e senso crítico, sem posar como herói da resistência. Não é muito e até uma obrigação. Mas, ante outras possibilidades de comprovada mediocridade, convenhamos, foi um bom começo. Garibaldi Alves deu o primeiro passo com o pé direito. Vejamos os próximos.