sexta-feira, novembro 23, 2007

Eduardo Azeredo, Cadáver adiado que procria

Cadáver adiado que procria

Quando estourou o escândalo Eduardo Azeredo, em 2005, escrevi em Primeira Leitura, e quem já era meu leitor sabe disso: esse caso é forte o bastante para golpear gravemente a chance de o PSDB vencer Lula. Chamei, então, Azeredo, recorrendo a uma imagem de Fernando Pessoa, de “cadáver adiado que procria”. “Adiado” porque o PSDB resistia em entregar a sua cabeça — como não entregou. E “procriador” porque iria gerar, evidentemente, uma seqüência de fatos negativos para o partido. Dois anos depois, vê-se, o imbróglio está aí, a se multiplicar. E continuará assim, já que agora o STF vai ter de analisar a denúncia. E é claro que vai acatá-la. Porque as evidências desse caso, como as do mensalão, aquele federal, são gritantes. Só uma nota: é óbvio que não atribuo a derrota dos tucanos apenas a Azeredo. Mas o PT precisava desesperadamente conferir verossimilhança à sua mentira básica: “Todos são iguais; fizemos o que todo mundo fez”. O senador mineiro cumpriu direitinho o seu papel...

À época, justiça seja feita, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso defendeu que não se o protegesse. Azeredo ocupava a presidência do partido. FHC queria que ele saísse. Mas o governador Aécio Neves se opôs. E, ainda agora, em nome de Minas, continua a ser o seu mais firme defensor. O governador de São Paulo, José Serra, também falou de sua honradez etc e tal. Todo o partido expressou uma certa solidariedade envergonhada. Mas é evidente que Azeredo deveria fazer o que jamais fará: renunciar ao mandato — e, se possível, desligar-se do partido, já que não tem como ser cassado.

Direi dele o mesmo que disse de Lula quando afirmou que não sabia do mensalão: ou mente ou se comportou como idiota. Em qualquer dos casos, trata-se de um desempenho lamentável. Observem que aquele que era o mais importante dos ministros de Lula caiu à esteira do escândalo. Mas, evidentemente, a repercussão na imprensa é menor. E é correto que seja. Um dos grandes contenciosos do PT com o sistema político é a questão ética. Até os “intelequituais” petistas admitem isso entre os seus. A alternativa viável de poder, hoje, é o PSDB. A sociedade lê o conjunto da obra pelo seu aspecto óbvio: cada partido protege o seu.

E isso é o mais perverso de tudo porque é, já escrevi umas duzentas vezes, falso. O que iguala os mensalões do PT e do PSDB? O operador foi o mesmo, Marcos Valério. Recorreu-se ao expediente do caixa dois. Algumas empresas púbicas estão metidas na lambança. E atenção: isso já é muito grave. É mesmo uma pena não poder cassar Azeredo por essa razão. Mas também há diferenças muito relevantes: o mensalão petista era um esquema de cooptação do Congresso, de compra de partidos políticos. Um deles é um esquema eleitoral, sem dúvida criminoso, mas quase banal. O outro, o petista, era parte de uma engrenagem que pretendia tornar irrelevantes os mecanismos da própria democracia. Alias, o próprio procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, reconhece a diferença: “Os fatos não são exatamente iguais. O procedimento que se adotou para fazer o desvio do dinheiro é o mesmo, mas com objetivos diferentes. Do ponto de vista do Ministério Público, isso não importa. O que importa é que os fatos sejam apreciados pelo Judiciário e recebidos. [Os desvios de dinheiro] são tão claros lá [no caso nacional] como aqui [Minas]. Só que aqui só há recursos públicos".

Estou pegando leve com Azeredo e os tucanos? Ao contrário. Além do erro, em si, de tentar pôr panos quentes no indefensável, contribuem, ao fazê-lo, para alimentar a desesperança de milhões de brasileiros. Mais: o que presta e o que não presta na política se misturam, tanto entre os partidos como dentro do próprio PSDB.

PS: Só uma nota: sou vacinado contra táticas petralhas. Uma delas é entrar no blog com aquela conversinha de que “todo mundo é igual”. Sei muito bem distinguir uma crítica pertinente às irresoluções do tucanato (e à sua moderação com o governo Lula) do proselitismo petralha disfarçado de espírito crítico. Afinal, o petralhismo disfarça tão bem quanto um gato escondido com o rabo de fora.

Tirem as crianças da sala: Berzoini faz a dança do acasalamento com Azeredo

Leiam o que vai abaixo, por Evandro Fadel, do Estadão. Volto depois:

O presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini, disse nesta sexta-feira, 23, em Curitiba, esperar que as denúncias de uso de recursos ilegais no financiamento da campanha de 1998 pelo PSDB em Minas Gerais, bem como as do chamado mensalão, que teria beneficiado parlamentares do PT e que agitaram o partido entre 2005 e 2006, não sejam usadas "de maneira oportunista" durante os debates eleitorais. "Precisamos dialogar sobre a estrutura partidária do Brasil e não sobre um evento que envolve um ou outro candidato", conclamou.

Defensor do financiamento público de campanhas, Berzoini afirmou que a denúncia feita pelo procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, contra 15 suspeitos de peculato e lavagem de dinheiro, demonstra mais uma vez a necessidade da reforma do sistema político. "Se não houver uma reforma política que crie o financiamento público de campanha esse risco vai continuar existindo na política brasileira", ressaltou. "O financiamento privado envolve muitas vezes a ação de pessoas que estão mal intencionadas e que acabam se aproximando dos políticos com outros interesses e oferecendo mecanismos de financiamento nem sempre transparentes."

Mesmo alertando para a necessidade de não se usar os dois episódios na argumentação política, o presidente do PT salientou que a denúncia apresentada pelo procurador-geral contra o esquema mineiro "demonstra que aquele tipo de ataque que foi feito contra o PT em 2005 e 2006 é absolutamente injusto porque esse tipo de risco existe para todos os partidos". Para ele, a denúncia "comprova que o esquema Marcos Valério (empresário mineiro) começou em Minas Gerais com o PSDB".

Mas imediatamente Berzoini retoma o tom conciliador entre os partidos. "Eu respeito o PSDB como adversário e não vou usar contra o PSDB armas de baixo nível", prometeu. "Pretendo trabalhar muito mais no debate político sobre o sistema de financiamento eleitoral do Brasil, demonstrando que eles (tucanos) foram injustos e oportunistas contra nós, mas nós não seremos porque não queremos baixar o nível da política", continuou. "Esse tipo de oportunismo, de querer caracterizar um partido como desonesto, não ajuda a democracia."

Berzoini exaltou a "correção e compromisso", que teriam sido demonstrados pelo ex-ministro das Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia, um dos denunciados, com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Até nesse ato de pedir o afastamento, ele demonstrou que não quer criar nenhum constrangimento", ressaltou. "Eu não acredito no seu envolvimento nessa questão, mas é a justiça que tem que apurar e não eu." Do mesmo modo, destacou a confiança na lisura dos atos do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG). "Não acredito que tenha agido de má-fé, assim como acredito que nossos companheiros não agiram de má-fé", afirmou.

Segundo ele, desde a crise que atingiu o PT, a direção nacional fez um alerta a todos os filiados espalhados pelo País para que "não criem riscos desnecessários". "A arrecadação de campanha e a despesa têm que ser contabilizadas, a lei assim o determina e nós temos que cumpri-la", voltou a advertir.

Voltei
Eis aí. É o efeito Eduardo Azeredo. Se uma frase pudesse sintetizar a opinião do presidente do PT, em cuja gestão se tramou a lambança dos aloprados do dossiê, ela seria esta: “Quando o assunto é sacanagem, somos todos iguais”. Para os companheiros da USP, em linguagem superior, o valente poderia dizer: “A culpa é do sistema”. Vale dizer: políticos desrespeitam as leis, fazem caixa dois, roubam os cofres públicos. Mas não têm culpa de nada E, vejam só, ele ainda quer financiamento público de campanha: quer tomar ainda mais do seu dinheiro, leitor amigo. Como se o expediente evitasse caixa dois.

Agora que virou establishment, o petismo se esforça para convencer a opinião pública de que a sua moralidade média é o piso e o teto da moral — ou seja: não é possível agir de forma diferente. E, como vêem, é mais um a dizer que o tucano Eduardo Azeredo é inocente, não é mesmo?, à medida que defende Walfrido dos Mares Guias. Ou os dois fizeram, ou nenhum deles fez. Berzoini, em suma, faz a dança do acasalamento com Azeredo. Tirem as crianças da sala

Tucanos que brincam com fogo

Por Renata Giraldi, na Folha Online:

O governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), foi ao Senado nesta sexta-feira exclusivamente para fazer uma visita de cortesia ao senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) — denunciado pela Procuradoria-Geral da República de envolvimento com o "mensalão tucano". A conversa durou cerca de meia hora e ocorreu no gabinete do parlamentar.

"Vim aqui dar um abraço no amigo Eduardo Azeredo. O que ele está passando é um percalço da vida pública. O importante é que ele [Azeredo] tem uma história de vida que é respeitada por todos. Ele está respaldado pelos mineiros", disse Aécio, ao sair abraçado com Azeredo do gabinete do parlamentar.

Apesar do tom otimista do governador, a Folha Online apurou que durante a conversa Aécio e Azeredo concordaram que o ambiente está difícil e o clima ainda é desfavorável ao senador. Aécio foi o único tucano, que integra o comando do PSDB, que visitou o Azeredo desde ontem.

O procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, ofereceu ao STF (Supremo Tribunal Federal) denúncia contra Azeredo e mais 14 suspeitos de participar do suposto esquema de desvio de recursos públicos para favorecer a campanha eleitoral ao governo de Minas de Azeredo, em 1998.

Na denúncia, Souza diz que foram desviados "R$ 3,5 milhões dos cofres públicos do Estado de Minas para a campanha de reeleição de Eduardo Azeredo, tendo como candidato à vice [governador] Clésio Andrade".

"O importante é ter serenidade", disse Aécio, referindo-se ao momento político de Azeredo. Além do governador, o senador conversou hoje — por telefone — com o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (PT). "O Pimentel me telefonou para prestar solidariedade", disse Azeredo.

Voltei
Se Aécio Neves for o candidato tucano à Presidência da República, já sabemos que essa conversa de moralidade na vida pública não será tema de campanha. Não depois da visita de hoje e do que se falou. E, caso Serra entre nessa também, idem. Então será justo supor que PT e PSDB se uniram na defesa de um método, de um modo de fazer política. Essa gente está brincando com fogo. Essa ida do governador de Minas ao Senado não era necessária — a menos que Azeredo esteja cobrando gestos largos de apoio e tenha como exigi-los.

Fernando Pimentel (PT), o prefeito de Belo Horizonte, o garoto-propaganda de shopping center, ligou dando apoio a Azeredo? Um momento lindo! Realmente demonstra que Minas está unida — em primeiro lugar, infiro, unida contra os mineiros.

Essa gente está brincando com fogo, repito. Aécio pode tentar ser o candidato do PSDB à Presidência com o apoio branco de Lula, não descarto isso. Mas, caso tal acordo não se consolide e seja ele o indicado do PSDB, está se preparando o terreno para uma terceira força, “não comprometida com nada disso que está aí”, um candidato que não seja obrigado a defender o mensalão de ninguém.

E ele já existe.

Lamento decepcioná-los

Caros,

Acho que vou decepcioná-los um tanto. No post acima, “Tucanos que brincam com fogo”, digo que essa defesa insana de Eduardo Azeredo abre uma picada para uma terceira força, que não seja obrigada a defender “mensalão” Cheios de otimismo, alguns me pedem: “Diga, Reinaldo, quem é o cara!”.

A resposta é péssima. Não poderia ser pior. Dado o cenário que expus abaixo (quem não leu o post anterior precisa fazê-lo para entender este), é Ciro Gomes, que pode vir a ter, sim, o apoio de Lula. E, não duvidem, se preciso, avançaria no pescoço de um candidato tucano com a história do mensalão. E não poderia levar, nesse particular, um contra-ataque.

Não acredito na viabilidade de algum outro candidato da oposição fora José Serra e Aécio Neves — o DEM sabe que não consegue fazer, até 2010, um candidato com chances de vencer a disputa. O PT forçará a mão para ter candidato próprio — se não conseguir viabilizar o Lula III. Se não tiver um nome de competitivo, pode muito bem cristianizar (quem não souber o significado político dessa palavra deve pesquisar os seguintes temos: “cristianizar” e “Cristiano Machado”) seu candidato e fazer a campanha para Ciro Gomes. Que, é claro, preservaria Lula de qualquer crítica.

Ciro Gomes? Santo Deus! Como diz certa piada, se vocês acham que o barítono é ruim, esperem só para ouvir o tenor... Entendam: a esta altura, no campo oposicionista, não há alternativas fora das duas que estão postas. O leque de surpresas possíveis é bem maior do lado governista.

Ciro? Seria o continuísmo sem continuidade. Mas com o ar refrigerado desligado.

Serra ou Aécio? Dos dois, que se avalie que tem mais chances de não ser nem continuidade nem continuísmo. Ou, numa outra hipótese, a continuidade sem continuísmo.

Enigmas...