Absolvido na primeira das quatro acusações que pesam contra ele no Senado, o presidente da Casa, Renan Calheiros, sentiu-se fortalecido e resolveu dar sorte para o azar.
Resultado: não atendeu à expectativa de seus aliados mais razoáveis - a tropa de almeidas e salgados não conta -, que esperavam dele o gesto do pedido de licença, e agravou uma situação que parecia administrada.
Semana passada a oposição radicalizou e nesta agora será a vez do PT de deixar cada vez mais evidente uma posição contrária à permanência de Calheiros na presidência do Senado enquanto não forem julgadas todas as representações contra ele.
Aquela impressão inicial, de que vencida a primeira etapa o jogo todo estava ganho, vai desaparecendo para dar lugar a uma paulatina perda de apoio que já traz de volta ao cenário a possibilidade real de uma cassação de mandato.
A se confirmarem de público opiniões de gente que até uma semana atrás integrava seu grupo de sustentação, trata-se a partir de agora só de uma questão de tempo e procedimentos.
Salvo no dia 12 de setembro por uma conjunção de votos favoráveis na oposição com a manobra petista em prol da abstenção da maioria de sua bancada, o presidente do Senado optou por confrontar a tudo e a todos, tendo como conselheiro principal o deputado Jader Barbalho.
Com isso, caminha para perder o que resta de apoio formal no PT. O governo terá ao seu lado enquanto o PMDB continuar comprando a sua briga. Na hora em que perceber que ao partido interessa a distância, o Palácio do Planalto oficializa as exéquias.
O advogado Eduardo Ferrão já pulou do barco. Mais gente pulará. Internamente, o PT é unânime no Senado em relação aos seguintes pontos: afastamento, julgamento único de todas as representações e sessão aberta no dia da decisão.
Mas por enquanto só quem tomou essa posição foi o senador Aloizio Mercadante. Ele, evidente, está interessado em salvar a própria aparência, depois de ser praticamente responsabilizado pela absolvição, mas não faria movimentos radicais no sentido contrário ao desejo da bancada e muito menos do governo.
E a bancada, em articulação conduzida por Mercadante, vai começar a deixar sua posição clara. Além de Mercadante, o vice-presidente do Senado, Tião Viana, também assumiu a linha de frente. E o fez já no dia seguinte à absolvição, quando admitiu publicamente que a presença de Renan Calheiros traria dificuldades grandes ao governo na votação da CPMF.
Discretamente, já se iniciaram conversações com o PMDB de forma a perceber se o partido faria algum movimento mais brusco na aliança com o Palácio do Planalto no caso de recrudescimento contra o presidente do Senado.
Dessas consultas resultou o seguinte: até os correligionários consideram mais prudente Renan Calheiros se afastar o quanto antes.
Como ele não concorda e continuará não concordando, daqui em diante o jogo será feito com muito menos tolerância. A começar pela circulação das informações colhidas pelo corregedor Romeu Tuma com João Lyra em Alagoas, até agora mantidas sob generosa proteção.
Sociedade
O inquérito da Polícia Federal que serve de base à denúncia do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, contra o chamado mensalão mineiro, explica mais sobre o recuo da oposição no auge do escândalo do mensalão petista do que a alegada intenção de não confrontar diretamente o presidente Luiz Inácio da Silva para que 'sangrasse' por si mesmo até a presumida derrota na reeleição.
Está lá escrito com todos os efes e erres: o tucano Eduardo Azeredo era o candidato à reeleição sustentado financeiramente por um esquema de desvio de verbas públicas para o caixa 2 da campanha dele e de diversos políticos integrantes da ampla aliança mineira, que incluía, além do próprio PSDB, o PMDB, o PTB, o PP, o PR, o PDT, o PT, o então PFL e nanicos de toda sorte.
Podem-se invocar diferenças entre um esquema e outro, sendo a principal delas a amplitude (uma foi federal e outra estadual) e a notoriedade dos envolvidos. É diferente também o impacto provocado por um caso e outro, já que no federal estava à frente um partido de combate em prol da ética e isso, obviamente, assusta bem mais.
Mas a gênese do sistema é a mesma: desvio de dinheiro público para financiamento de campanhas eleitorais por meio de contratos de publicidade fraudulentos com as empresas de Marcos Valério de Souza.
O PSDB - e também o PFL, ao qual era filiado o vice de Azeredo, Clésio Andrade - protegeu seu então presidente, Eduardo Azeredo, não se dissociou dele e não teve outro jeito a não ser desistir de levar a ferro e fogo a confissão de Duda Mendonça de que foi pago pelos serviços de marqueteiro oficial da campanha presidencial de 2002 por meio do valerioduto.
E qual a esperança do tucanato? Que, ficando Lula de fora da denúncia, Azeredo poderia também não ser citado, por uma questão de isonomia de tratamento.