As gravações das caixas-pretas do Airbus-A320 da TAM confirmam uma combinação explosiva, fatal: pilotos mal treinados, equipamentos falhos, condições precárias da pista, companhias gananciosas e inação do fabricante para corrigir defeitos e normas que já tinham causado acidentes anteriormente. Mais uma vez, o desastre de Congonhas tinha de ter sido evitado, e 199 vidas poderiam ter sido salvas.
O importante "furo" jornalístico de Fernando Rodrigues na Folha de S. Paulo, hoje, com os dados do vôo e as vozes dos pilotos, é um alerta geral de que é preciso mais cuidado, mais eficiência, mais responsabilidade para lidar com aviação. Os aviões são equipamentos fantásticos e seguros. O defeito está nas pessoas que os comandam, que os produzem, que possuem _pilotos,fabricante, donos.
Os dados mostram que o reverso e os "spoilers" (freios aerodinâmmicos) não funcionaram. Nada funcionou. Em vez de desacelerar e parar, o avião continuou acelerando, desgovernado, como se pilotos, manetes e computadores fossem incapazes de se entender.
Como não é a primeira vez que um avião com reverso pinado, ou seja, travado, se acidenta, é fundamental que a Airbus reveja o que está acontecendo com esse equipamento e impedir que aviões possam continuar voando por até dez dias mesmo com um deles inoperante. Já estão confirmados pelo menos dois acidentes, um em Taiwan e outro nas Filipinas, mas já começam a surgir informações sobre outros, um nos EUA e outro no Canadá.
Além disso, a TAM jamais poderia permitir que um avião lotado (aliás, com um passageiro a mais), com tanque cheio, com reverso pinado, ou seja, travado, e com um dos pilotos ainda terminando sua fase de treinamento na companhia pudesse voar numa pista curta, de apenas 1.940 metros, sem área de escape -- e num dia de chuva! Pista curta e escorregadia é sinal amarelo, ainda mais com todas as condições desfavoráveis do próprio avião.
Tudo indica que houve falha humana no manuseio das manetes, que estavam na posição errada, mas para falar de "falha humana" é preciso falar das falhas humanas dos fabricantes, da dona do avião, dos responsáveis pela pista. Uma seqüência de falhas humanas.
Sem contar com um dado fundamental que ainda não está claro: se os computadores "enlouqueceram" porque os pilotos lhe enviaram comandos incompreensíveis ou se sofreram algum tipo de pane. Compete às autoridades aeronáuticas esclarecer. Amanhã haverá reunião delas, inclusive com representantes estrangeiros, para avançar ainda mais nesse ponto crucial.
As causas do acidente vêm se desenhando com uma rapidez fantástica, como se todos, brigadeiros, parlamentares, policiais e jornalistas tivéssemos aprendido enormemente com o choque do Legacy com o Boeing da Gol e tenhamos muito mais capacidade de descobrir e avaliar. Nunca é demais, porém, reforçar que acidentes aeronáuticos são muito complexos. Nunca se podem descartar o surgimento de novos fatores, até formar um conjunto pronto e acabado.
Questão de Justiça
Com a saída de Waldir Pires do Ministério da Defesa, agora querem transformar o presidente da Infraero, brigadeiro J. Carlos Pereira, no vilão número um da crise aérea. Injusto. A Infraero liberou a pista por orientação da reguladora, que é a Anac. Além disso, Pereira conhece o setor e tem sido fundamental para dar satisfações que a opinião pública exige. Enquanto outros se acovardam e calam, ela assume e explica.
Apesar de militar, tem tido mais compromisso com a transparência do que muitos que passaram décadas falando em democracia e agora se trancam mudos em palácios.