sábado, agosto 25, 2007

O Conselho de Ética vai pedir a cassação do senador

A farsa na reta final

O Conselho de Ética vai pedir a cassação de
Renan Calheiros por ele ter usado lobista de
empreiteira para pagar suas despesas pessoais


Otávio Cabral

Dida Sampaio/AE
O senador Renan Calheiros tenta se salvar usando a tática de negar tudo apenas para confundir


O Conselho de Ética deve concluir nesta semana o relatório que vai pedir a cassação do mandato do senador Renan Calheiros. O processo investiga se o senador quebrou o decoro parlamentar ao ter as despesas pessoais pagas por um lobista da empreiteira Mendes Júnior. Renan tentou durante três meses convencer seus pares de que ele é homem rico, que o lobista apenas lhe prestou um favor como amigo e que o dinheiro da pensão saiu de suas contas. A Polícia Federal implodiu essa versão. Ao examinarem os extratos bancários do senador, os peritos não encontraram nenhum registro de que os recursos usados pelo lobista pertenciam a Renan. A perícia na contabilidade do presidente do Congresso revelou ainda que quase nada do que o senador apresentou para justificar a origem de sua fortuna tem explicação documental. Renan ficou rico vendendo bois que não se sabe se existiram mesmo, e seu patrimônio declarado, estimado em 10 milhões de reais, é incompatível com sua renda. Se não bastasse, o laudo da polícia ainda listou uma nova e suspeitíssima operação com as digitais de Renan Calheiros.

Ao analisarem os extratos bancários de Renan, os peritos descobriram que havia uma diferença considerável entre as despesas e as receitas do senador. Ao contrário do que afirmava, Renan não tinha em conta dinheiro para pagar a pensão da filha que teve com a jornalista Mônica Veloso. Indagado a respeito, o senador informou à polícia que complementou o dinheiro que faltava com um empréstimo. Para provar o que dizia, Renan apresentou cópia de um contrato de mútuo e notas promissórias da transação. Como tudo o que o senador faz no mundo dos negócios é estranho, esse também não deixou a dever. Quem empresta dinheiro ao senador é uma locadora de veículos de Maceió, a Costa Dourada Veículos. A empresa pertence a Tito Uchôa, primo de Renan e seu testa-de-ferro em uma rede de empresas de comunicação em Alagoas. O empréstimo, no valor de 178 000 reais, é um negócio de pai para filho – ou de laranja para senador. Os documentos não têm registro em cartório, os contratos não têm sequer as assinaturas das partes, a dívida jamais foi paga e o dinheiro foi entregue em espécie e em parcelas mensais da empresa. Algo muito parecido com a conhecida Operação Uruguai, uma farsa montada para tentar explicar a origem do dinheiro que sustentava as despesas pessoais do ex-presidente Fernando Collor, aliado de Renan.

Marco Borelli/O Jornal
Jose Emilio Perillo
Tito Uchôa, o primo-laranja do senador: negócios e empréstimo suspeito

Tito Uchôa, como se sabe, era um sujeito modesto, que virou um bem-sucedido empresário depois de fazer negócios em nome do senador Renan Calheiros. O contrato entre Renan e Tito, porém, pode esconder outro negócio escuso do senador. A locadora Costa Dourada presta serviços a oito órgãos públicos de Alagoas – duas empresas estaduais, quatro secretarias, o Tribunal de Contas de Alagoas e uma prefeitura municipal. Talvez por coincidência, o senador Renan Calheiros é padrinho político dos dirigentes de alguns desses órgãos. Na época do empréstimo, a prefeitura de Barra de São Miguel, a paradisíaca praia situada a 35 quilômetros de Maceió onde o senador tem uma belíssima casa à beira-mar, era comandada por Reginaldo Andrade, amigo e integrante do PMDB de Renan. A Companhia Energética de Alagoas (Ceal), uma das principais clientes da locadora, tinha o diretor financeiro e o diretor de operações nomeados por Renan. A seqüência mais interessante de coincidências, porém, se deu na Secretaria de Assistência Social, outra cliente da locadora. Na época da assinatura dos contratos, ela era comandada por Carlos Ricardo Santa Ritta, assessor de Renan.

Para quem não se lembra, Santa Ritta foi o laranja do senador Renan Calheiros na rádio e no jornal comprados em uma sociedade secreta com o usineiro João Lyra. Pois o laranja Santa Ritta, como secretário de estado indicado por Renan, contratou a empresa do laranja Tito Uchôa, responsável pelos pagamentos que viabilizaram a sociedade do senador com o usineiro alagoano. A empresa de Tito Uchôa, sabe-se agora, repassava dinheiro em espécie, como se fosse um empréstimo, ao senador Renan Calheiros. Resumindo: o dinheiro saía dos cofres públicos por ordem de um laranja-secretário, ia para a conta de um laranja-empresário e, depois, pingava no bolso do presidente do Senado. Os empréstimos, segundo o senador, em depoimento ao Conselho de Ética, foram mantidos em segredo para preservar sua intimidade. Com essa triangulação, Renan tenta provar que não precisava de um lobista para pagar suas despesas. Como se vê, a situação do senador chegou a um ponto tal de desmoralização que ele nem se constrange mais em justificar uma história escabrosa confessando outra.

Com reportagem de Alexandre Oltramari