terça-feira, julho 31, 2007

Lula diz que vaias não vão afastá-lo das ruas e lança desafio

Editado por Adriana Vandroni
'Se quiserem brincar com democracia, ninguém sabe colocar mais gente na rua do que eu', desafia Lula

Fausto Macedo, do Estadão
Filipe Araújo/AE

Lula no lançamento do PAC em MT
CUIABÁ - O presidente Lula afirmou nesta terça-feira, 31, em Cuiabá que as vaias não vão afastá-lo das ruas. Disse que vaias não o intimidam e não vão trancá-lo em seu gabinete no Palácio do Planalto. Ele chamou para o desafio brasileiros que o têm vaiado. "Se quiserem brincar com a democracia, ninguém sabe nesse País colocar mais gente na rua do que eu", declarou o presidente em auditório fechado do Centro de Eventos do Pantanal, onde anunciou para mil convidados - rigorosamente selecionados e que muito o aplaudiram -, a liberação de R$ 521, 5 milhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para obras de saneamento básico no Mato Grosso.
Os apupos que provocaram a reação presidencial têm se repetido desde a abertura dos Jogos Pan-Americanos do Rio, quando Lula foi vaiado seis meses e desistiu de fazer o discurso de abertura. Nesta terça, as vaias partiram de um grupo de manifestantes que foram barrados em um trevo de acesso a 300 metros da solenidade. O comboio presidencial passou à toda por eles. Entre 60 a 70 pessoas, segundo cálculos da organização do movimento denominado "Eu também vou vaiar Lula", receberam Lula com gritos e assobios. Elas distribuíram adesivos e camisetas com a frase que marca o protesto. A assessoria do presidente contou "uns 8" opositores.
"O recado foi dado", disse Flávia Salem, empresária de comunicação e coordenadora do movimento. "Estamos com a alma lavada porque vaiamos muito, mas muito mesmo, até cansar, e é claro que o presidente ouviu e por isso ficou tão incomodado. Não fosse o medo de represálias, a mobilização teria sido 10 vezes maior. Inclusive muito servidor público queria ter participado."
"Se alguém acha que com estupidez vai atrapalhar que a gente faça o que precisa ser feito pode tirar o cavalo da chuva", retrucou Lula, já na cerimônia do PAC que reuniu deputados, senadores, prefeitos e o governador Blairo Maggi (PR). "Ninguém vai me ver de cara feia por isso. Podem ficar certo meus companheiros e companheiras que ninguém vai ficar com saudade de ver o Lula na rua. As ruas desse País de 8,5 milhões de quilômetros quadrados eu vou visitá-las quase todas nesse mandato. Com a democracia não se brinca, o que vem depois dela é sempre muito pior."
Acredita ter identificado quem o hostiliza. "Os que estão vaiando são os que mais deveriam estar aplaudindo. Foram os que ganharam muito dinheiro nesse País no meu governo. É só ver quanto ganharam os banqueiros os empresários."

Explicações
Lula explicou que não é medo de vaia que o fez realizar a solenidade em um ambiente só para convidados, longe dos oponentes. "Estou fazendo esse ato aqui, em lugar fechado, porque é um ato institucional, que envolve dinheiro público, prefeitos, deputados. Eu não estou fazendo comício."
Mirou novamente quem o vaia. "Não conheço um deles que tem uma biografia que lhe permita sequer falar em democracia nesse País. E eu conheço muitos deles. "Apontou o que considera causa da inquietação rival. "Você imagina eu, um homem que tenho como formação máxima da minha vida um diploma primário e um curso de torneiro mecânico. Quando eu terminar meu mandato em 2010 vou passar para a história como o que mais fez universidade federal nesse País. Além disso, em 97 anos fizeram 140 escolas técnicas. Em 8 anos vamos fazer 160. Isso deve incomodar a muita gente."

Ataque a Alckmin
Falou de mesquinharia na política e atacou Geraldo Alckmin (PSDB), que com ele disputou a Presidência em 2006. "A política tem um lado mesquinho, um lado pequeno. Quem perde fica dentro de casa acendendo vela cabeça de galo, cabeça de urubu, fazendo coisa para que não dê certo. Mas isso é de uma imbecilidade total, chega a ser uma coisa quase que insana. Acho um exagero a quantidade de mesquinharia que se fala numa campanha. Fui quase um gentleman na disputa com o meu adversário. Ele, que era um gentleman, virou quase que coisa louca na TV, brabo, nervoso. Terminadas as eleições é preciso a gente dar um tempo para o País. que o País tenha um tempo de governabilidade."
Previu "uma guerra" em 2008, nas eleições municipais. "Vai ter disputa para prefeito agora, daqui a um ano começa a guerra, todo mundo xinga todo mundo, tem vereador, tem um monte de coisa. Acabou as eleições todos precisamos torcer para que o eleito consiga fazer alguma coisa para melhorar. O que eu ganho torcendo contra? Não posso ser mesquinho nesse ponto."

Marcha com Deus pela Liberdade
Lula prometeu "continuar sua trajetória", independente de vaias, e assegurou que tem amigos no PSDB e que está acima de diferenças político-partidárias. "Tenho um compromisso, tenho data definida para deixar o mandato, tenho consciência do que queremos fazer e vamos fazer sem nenhuma preocupação.Todo mundo sabe das relações que eu tenho com o PSDB na maioria dos Estados. Sou amigo de muita gente do PFL e de outros partidos. Não consigo misturar minha relação pessoal com questão partidária, mas tem gente que não pensa assim. Essa gente fez a Marcha com Deus pela Liberdade em 64 que resultou no golpe militar, essa gente que pensa assim levou o Getúlio Vargas ao suicídio, levou João Goulart a renunciar, ficou contente com 23 anos de regime militar e está incomodada com a democracia porque a democracia pressupõe o pobre ter direito, ter Bolsa Família sim."
Anunciou, por fim, que voltará ao Mato Grosso muitas outras vezes, inclusive para pescar com Blairo Maggi no rio Cuiabá. "Não tentem achar que, vendendo notinha para os jornais de que vai ter manifestação contra o presidente em tal lugar, que o presidente vai deixar de ir. Esse presidente tem tanto medo que, em 1975, quando diziam que a porta da Volks estava cheio de militar para não deixar fazer assembléia, aí é que eu levantava às 4 da manhã para fazer assembléia. Quando diziam que era proibido fazer as greves eu ia fazer as greves."
Por fim, até fez elogios ao Parlamento. "Quando vejo gente criticar o Congresso, com todos os defeitos que possa ter o Congresso, eu ponho a mão para o céu todo dia e agradeço a existência dele porque sem ele esse País era muito pior."