"Eu não vim aqui para dizer o que vossas excelências querem ouvir", advertiu o advogado Pedro Calmon Mendes em depoimento ao Conselho de Ética do Senado. De nada adiantou. Os governistas, e até alguns oposicionistas, sob a batuta do presidente do Conselho e relator substituto, Sibá Machado (suplente de Marina Silva, portanto, senador sem votos), insistiram em provocar o representante da jornalista Mônica Veloso para confirmar a defesa arquitetada pelos advogados do senador Renan Calheiros com o fim de justificar pagamentos de pensão à filha da jornalista superiores a seu salário como parlamentar. Melhor, para negar que os recursos tenham saído dos cofres da empreiteira Mendes Júnior via lobista Cláudio Gontijo. O senador Valter Pereira, peemedebista de Mato Grosso do Sul, municiado pelos advogados do presidente do Senado, quebrou até um sigilo judicial para cumprir, com louvor, a tarefa que lhe coube na farsa para livrar o colega alagoano de uma eventual perda de mandato ou renúncia. Revelou a sentença para o pagamento de pensão à menina de três anos, tradicionalmente um segredo nas varas de família. Leu apenas o trecho que lhe interessava para fundamentar os argumentos do parceiro de partido e de governo. Coube ao advogado de Mônica contar que a pequena herdeira do parlamentar receberá R$ 7 mil mensais a cada mês. Os senadores aliados do presidente da Casa se esforçaram para limitar o caso a uma querela entre um homem e uma mulher que mantiveram uma relação extraconjugal por anos, geraram uma filha e chegaram a um acordo amigável sobre o destino e o futuro financeiro da pequena inocente. Isso nunca esteve em discussão desde que a revista Veja publicou reportagem revelando que o xis da questão era a origem do dinheiro até então pago por Renan Calheiros para a filha e a mãe dela. Os reais eram da empreiteira, do lobista ou do senador? Durante todo o tempo, o nome da Mendes Júnior foi diplomaticamente ignorado, pelo advogado e por parlamentares. Por quê? A construtora mineira se manifestou em nota oficial para negar qualquer ligação com o caso pessoal. Confirmou apenas doações legais a campanhas do parlamentar em sua terra natal. Na atividade parlamentar, quantas emendas de autoria de Renan tiveram o objetivo de beneficiar obras públicas tocadas pela empreiteira? Por que os parceiros do Senado não investigaram tais fatos? Por que aceitaram rapidamente documentos, falsos ou não, enviados pelo colega sem se aprofundar? Por que aceitaram apenas os argumentos dele e não ouviram a jornalista, a outra parte? Mônica assegura que recebia a pensão em cash, no escritório do lobista. Cláudio Gontijo alega que repassava os recursos entregues pelo pai da menina. Ora, se o senador concordou, desde o início, em pagar a pensão, por que precisava de intermediário para enviá-lo à mulher com quem viveu uma intensa paixão durante 36 meses? A vida pessoal de qualquer político só interessa quando ultrapassa os limites do particular ao envolver recursos públicos. O affair do presidente do Congresso está sub judice porque envolve a suspeita de uso de reais de uma empreiteira de obras públicas em pagamento por suposto beneficiamento em emendas ou licitações de construções sustentadas por verbas federais. E é este o fato que a sociedade exige que seja apurado pelo Conselho de Ética, pela polícia e pela Justiça. No Senado, o palco está montado para inocentar Renan. Difícil será convencer a opinião pública, hoje, depois da apresentação da perícia, pela Polícia Federal e técnicos do Senado, das notas fiscais de compra e venda de gado a laranjas ou empresas inexistentes em Alagoas. Não importa o teor da conclusão dos especialistas e agentes federais, o senador já foi condenado pela opinião pública. E seu caso se soma a centenas de outros do passado que levaram o Congresso aos piores índices de avaliação de desempenho pela população. E às mais irrisórias taxas de credibilidade. Ana Tahan escreve nesta coluna às terças-feiras. |