domingo, maio 27, 2007

Clóvis Rossi: Renan e a mulher de César - 27/05/2007

Folha de S.Paulo - Paris -

PARIS - Renan Calheiros é inocente até prova em contrário, valha a
obviedade. Inocente do ponto de vista jurídico, esclareça-se. Mas, do
ponto de vista político, deveria ter caído naquela história de que à
mulher de César se exige não apenas que seja inocente, mas que pareça
inocente.
O problema no Brasil é que, nos últimos muitos anos, deixou-se de
aplicar essa regra preciosa. Vejamos o retrospecto político de Renan
Calheiros. Foi adversário ferrenho, em Alagoas, de Fernando Collor de
Mello.
De repente, virou um "collorido" desde a infância, a ponto de ter
participado do esquema de lançamento da aventura Collor à Presidência
da República.
Preciso lembrar tudo o que significou essa aventura, seja do ponto de
vista da baixeza utilizada contra Luiz Inácio Lula da Silva, durante
a campanha, seja do ponto de vista da corrupção que o levou a ser
condenado por falta de decoro?
Lembro só uma história: um dia de 1992, me tocou conversar com PC
Farias, o tesoureiro da aventura, no luxuosíssimo hotel Ritz de
Barcelona. Queixou-se dos prejuízos que sua atividade empresarial
sofrera com as acusações. Perguntei com um sorriso irônico se ele
ficara pobre.
Percebeu que eu não estava acreditando no seu sofrimento. Abriu os
braços para mostrar o requintado salão do hotel, repleto de cristais,
e respondeu, cínico: "Você acha que quem pode se hospedar aqui está
pobre?".
Renan Calheiros pode não ter se beneficiado do esquema, mas conviveu
com ele gostosamente, alegremente. Portanto, não cumpre o requisito
exigido da mulher de César. Não obstante, seus pares e os governos
Lula e FHC (de quem foi ministro) aceitaram-no assim mesmo. A
prudência pediria certo distanciamento sob pena de todas as mulheres
de todos os césares caírem na boca do povo.
crossi@uol.com.br