PARIS - Faz alguns anos, Aloizio Mercadante (PT-SP) me sugeriu que escrevesse a biografia de Octavio Frias de Oliveira, a quem considerava (como eu, aliás) um extraordinário personagem. Disse-lhe que não poderia fazê-lo porque não tinha o menor distanciamento em relação a "seu" Frias.
Eu não conseguiria fazer uma biografia apenas a favor, ainda mais que aprendi com o próprio "publisher" deste jornal o valor incomensurável da independência. Assim como aprendi também com ele, embora mais com o filho, Otavio, o diretor de Redação, a introjetar no DNA o jornalismo crítico que marca a Folha.
Como o próprio Frias pai disse, "não há preço que pague a independência. Nós a cultivamos religiosamente, e essa é uma das razões do sucesso da Folha".
Muito antes que essa frase saísse na sua biografia, ele já me havia ensinado a lição. Eu era correspondente do jornal em Buenos Aires, passei pelo Brasil de férias, em 1982, e fui visitá-lo. Reclamei de estar demasiadamente preso à Argentina, sem poder viajar pelos outros países latino-americanos, dados os custos envolvidos.
A resposta dele foi cortante: "A independência que você tem hoje para escrever depende da independência financeira da empresa, que depende de um orçamento bem controlado. O que você prefere, a independência ou o risco de um descontrole orçamentário?".
Sei bem que muito petista hidrófobo, como antes muito tucano hidrófobo (e outros leitores), duvida da independência da Folha. O fato de tanto Lula como Fernando Henrique Cardoso comparecerem por fim ao mesmo evento, o velório de "seu" Frias, diz tudo sobre a cultura que ele inspirou.
Prova, ademais, que as críticas a ambos, por duríssimas que tenham sido, ficaram no limite daquilo que deve fazer um jornal plural e crítico, mas republicano.