Em suas falas inaugurais, o presidente Lula exaltava a equiparação dos bingos às atividades mais límpidas
O NOTICIÁRIO , vasto e chocante, sobre uma parte da intimidade financeira entre exploradores de bingos e juizes, advogados e policiais faz lembrar que, em seu primeiro ano, o governo Lula apresentava como uma das metas de curto prazo a legalização desses cassinos, para acabar com todas as possíveis controvérsias a respeito.
A disposição era tal, que já em suas falas inaugurais (nem imaginávamos o que o futuro nos imporia, nesse quesito) Lula exaltava a equiparação dos bingos às atividades mais límpidas, com referências à educação e outros deveres sociais. José Dirceu, por seu lado, deixou uma espécie de aval aos bingos. Ou seria também a Lula? Menos citado, antes que Waldomiro Diniz dissolvesse a meta do governo, foi que a controvérsia sobre a contravenção acabaria, também, se os bingos fossem proibidos de uma vez, como determina a Constituição para os jogos de azar.
Diante do noticiário atual, você já se perguntou o que teria levado Lula e seus próximos a chegarem ao Poder com preferência, tão pressurosa, pela legalização em vez da proibição?
Concordo em que é um tipo de pergunta sem necessidade de resposta. Mas que tem várias possíveis utilidades, lá isso tem. Seja como for, preveni-me com uma pergunta alternativa e, neste caso, com resposta só dispensável aos de certo ramo de transações entre governos e particulares.
O bingo e seus juizes tiveram que disputar espaço, na semana, com outro tema de igual toxidade. Esteve no noticiário contraditório, quase todo dependente do tipo de relações do respectivo jornalista com Lula ou o Planalto, sobre o confronto entre o Meio Ambiente e o projeto de hidrelétricas que mudariam a geografia e tudo o mais na região amazônica do imenso e belo rio Madeira.
O que causa a controvérsia, se é tão clara a lei que exige, para aprovação ou rejeição de obras, o estudo de suas conseqüências sobre a natureza ambiente, o clima e a vida humana? A melhor maneira de não perder tempo na deliberada barafunda do palavrório técnico, mas formar uma noção do que motiva a batalha pela construção urgente, está aqui: é obra de R$ 20 bilhões. Não contados os complementos para distribuição da energia. Nem incluídos os reajustes de sempre, e sempre de dimensões sufocantes (veja o caso do Pan), nas obras públicas. Ou seja, é obra para uns R$ 40 bilhões ou mais.
A conversa de que Lula, com sua pressão sobre a ministra Marina Silva e contra os técnicos do Ministério do Meio Ambiente, "responde à ética da responsabilidade", para "viabilizar a oferta de energia" e "assegurar o crescimento" tem precedente: é o mesmo argumento, atacado pelo Brasil e por quase todo o mundo, usado pelos Estados Unidos para não assinar o Protocolo de Kioto e continuar acelerando o aquecimento e a poluição do planeta, por entenderem que alterações na oferta e uso de energia prejudicariam o vigor econômico do país.
Não é de agora que Lula assume a condição de maior opositor do meio ambiente entre nós. Já nos primórdios do primeiro mandato, desfez-se de tudo o que pregara contra a precipitação de alimentos transgênicos. Deu cobertura ao plantio ilegal e à comercialização idem de soja transgênica. A pretexto de que o plantio foi extenso e puni-lo, porque ilegal, causaria prejuízos altos aos plantadores. Entre os quais, alguns dos "mais ricos" (da soja e de transgenias financeiras) que permutam encantamentos mútuos com Lula. Pois é, há também presidentes transgênicos.
O meio ambiente para Lula parece resumido à jabuticabeira que Marisa da Silva, diz ele, plantou em vaso, isolada, no seu apartamento do ABC. E que, diz ele, produz safras de frutos excelentes. Um dia a botânica estudará esse fenômeno que integra as verdades servidas por Lula aos brasileiros. Mas talvez não tenha o que estudar na Amazônia brasileiro-boliviana do grande Madeira. Não faz mal. Se depender de Lula e sua velha preferência, os botânicos distrairão o tempo nos bingos, também caudalosos. Em dinheiro.